O pão nosso de cada dia dá-nos hoje... Mateus 6:11.
Estive recentemente com parte de minha família em Istambul. Lá,
fomos visitar o Mercado das especiarias em busca de alguma das muitas que
preenchem as prateleiras de suas lojas. Queríamos comprar uma essência especial
que gostamos. Mas, que aroma escandaloso! O perfume dos temperos inebriava o
olfato e me reportou à história universal.
Talvez, o que vou dizer aqui tenha começado com as Cruzadas, no
século XI. Na busca pela conquista de Jerusalém, que se achava nas mãos dos
turcos, os cruzados tomaram conhecimento das especiarias orientais. Os europeus
não tinham uma culinária mais requintada. A cozinha dos romanos não era nada de
excelência e a influência dos bárbaros, nesta área, foi de uma rusticidade,
própria da sua flora. Faltavam-lhes os temperos.
O contato com estes condimentos despertou nos europeus um
interesse especial por tais produtos, uma vez que o seu lucro chegava a 10.000%.
Uau! Nada mais animador para o comércio do que um resultado astronômico como
este.
O tempero que excitou a expansão das grandes navegações, nos
séculos XIV e XV, foi o sabor e a lucratividade dos condimentos. A descoberta do
Continente Americano, por exemplo, tem o gosto e o lucro das especiarias. Muito
da nossa história se deve ao “cheiro verde” do Oriente. Foram os ingredientes
culinários que abriram os caminhos das Índias e que acabou dando as caras no
Brasil por causa das tais calmarias.
A história do pecado também teve o seu começo pela boca. Foi um
fruto, bom para se comer, que despertou o apetite insaciável pela
teomania de Adão e Eva.
Daí para frente a raça humana ficou alucinada com a ideia de
ser como Deus. A loucura pela primazia veio de uma fome visceral por importância
que não tem a mínima importância para a condição inerente aos filhos de Deus. O
filho é filho e pronto.
O estômago tem governado o anseio da insatisfação pessoal e
muita gente vive para compensar a sua carência de significado, comendo qualquer
coisa a qualquer custo. Veja por exemplo: Esaú acabou vendendo a sua
primogenitura por um PF de lentilhas, ou seja, um prato feito. Comerciou barato
aquilo que é caro para Deus.
Isaque, o patriarca “cegueta” físico, e míope espiritualmente
falando, movido por uma famigerada ambição paternalista de poder coroar o
primogênito às pressas, abençoou Jacó, o filho assaltante, depois que ele se
tornou o chefe do restaurante da Trapacearia, sob a influência de uma
especialidade: guisado de cabrito em lugar da caça.
A caçada do espertalhão deu “bode” e causou uma indigestão
emocional de gerações em gerações, até o dia de hoje. Esse banquete bancou uma
desintegração de proporções universais "jantando" a amizade da família para
sempre.
O ser humano faz parte de uma espécie caída que sofre de uma
fome crônica em busca de uma identidade que mereça a credibilidade pública. Essa
fome tem despertado uma variedade de cardápios químicos no sentido de tentar
saciá-la. A humanidade busca satisfação em todo tipo de iguaria ou droga para
matar a fome de sua alma.
Os inimigos da cruz de Cristo vivem dos estímulos viscerais.
Eles vendem a alma por migalhas de atenção e negociam a sua aceitação por
qualquer quirera. Mas veja como o apóstolo os avalia: O destino deles é a
perdição, o deus deles é o ventre, e a glória deles está na sua infâmia, visto
que só se preocupam com as coisas terrenas. Filipenses 3:19.
Quando o apetite “carnal” governa o cérebro, temos uma
obesidade emocional sem limite. A fome de ascendência e o medo da rejeição geram
vassalos com este perfil: porque esses tais não servem a Cristo, nosso
Senhor, e sim a seu próprio ventre; e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o
coração dos incautos. Romanos 16:18.
Os temperos, neste mercado, são variados, mas a fome da alma é
única. Todos nós temos fome de aceitação e nada que seja finito consegue
satisfazer o apetite por um amor eterno e incondicional. Eu tenho fome de Pão do
céu e não de pão francês ou dos brioches, que segundo as más línguas, resultaram
na revolução francesa.
Na tentação do ermo, no momento da solidão, quando o Maligno
propunha uma transformação de pedras em pães, para matar a fome de Jesus, ele
respondeu: não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de
Deus. Mateus 4:4.
A Palavra que sai da boca de Deus é o próprio Cristo, o Verbo
encarnado ou a Palavra viva que veio como o Maná para satisfazer a fome de
significado da alma esfomeada. Só ele pode matar a fome de aceitação
incondicional, que habita nessa alma insatisfeita.
Muitos querem saciar a sua fome de significado com o saber; mas
o conhecimento incha. Há muita gente empanturrada de informações e completamente
vazia de afetos. São sabidas, sem saber que são ocas de amor. Têm um armazém
abarrotado de sapiência e um terreno baldio de afeições, enquanto morrem de fome
espiritual.
Outros fazem do ter a base de sua satisfação. Amealham o máximo
que podem na tentativa de suprir o déficit emocional de sua alma. Eles pensam
que o superávit bancário pode bancar o vazio de significado que consome
alucinadamente o seu íntimo.
Ainda há aqueles que investem quase todo o seu tempo no fazer,
supondo que as suas realizações vão compensar a carência existencial que circula
em seu coração, clamando por aceitação irrestrita. Fazem tudo, e de tudo,
esperando serem vistos pela plateia.
Por outro lado, os críticos, invejosos e gananciosos, membros
do sindicato dos inconformistas, aparecem nos bastidores da cena exercendo o seu
papel indigesto de insatisfação crônica. Ninguém, neste mundo de carências,
consegue viver satisfatoriamente feliz.
O fato crucial da existência humana é que a alma continua
faminta e gritando por significado incondicional. Há uma fome intrínseca no mais
íntimo do ser humano que não consegue ser satisfeita com os farelos do saber,
ter e fazer.
A fome da alma requer o Pão do céu que a mitigue com o amor
pleno da graça, ao transformar o mendigo carente, num filho legítimo de
Abba.
Saul odiava Davi; contudo o seu ódio não impediu ao seu neto
Mefibosete, o filho de Jônatas, um aleijadinho dos pés e indigno de participar
do banquete real, que tivesse um lugar de honra à mesa do rei Davi. Além do seu
lugar como celebridade, aquele, cujo nome significa: “exterminando o ídolo”,
celebrava a ágape da aceitação imerecida.
O verdadeiro Maná que mata a fome de importância do ser humano
é a condição de ser feito filho de Deus pela Pessoa e a obra vicária do Cordeiro
de Deus.
A vida que dá vida está contida na essência do Pão celeste.
Porque o pão de Deus é o que desce do céu e dá vida ao mundo. João 6:33.
Este Pão, não só alimenta a alma faminta, como gera a vida que tem sentido
eterno. A vida sem acessórios interinos.
A metáfora bíblica que define esta realidade espiritual se
resume nestas palavras sagradas: Declarou-lhes, pois, Jesus: Eu sou o pão da
vida; o que vem a mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede.
João 6:35. Isto não é apenas “fome zero”. É a satisfação plena na
suficiência de Cristo.
Cristo Jesus, além de ser a própria vida espiritual é também o
pão que lhe sacia a fome. Neste caso, o cristianismo não se trata de uma
evolução da vida adâmica, mas da substituição desta vida terrena de Adão pela
vida celestial de Cristo, bem como a satisfação existencial promovida pela
própria Pessoa daquele que é o Pão da vida.
O pão nosso de cada dia nada mais é do que o Maná que desceu do
céu, isto é, Cristo, que também é a essência encarnada da existência espiritual.
Pois a minha carne é verdadeira comida, e o meu sangue é verdadeira bebida.
João 6:55. Cristo é, ao mesmo tempo, a raiz da redenção, o tronco da
santificação e a seiva que nutre a fome da alma.
O único banquete que satisfaz a fome permanente de sentido para
existência humana é a Pessoa e obra do Cordeiro de Deus. Quem comer a minha
carne e beber o meu sangue permanece em mim, e eu, nele. João 6:56.
Certamente essa linguagem aqui não trata de antropofagia, mas
da metáfora ligada à assimilação da vida de Cristo Jesus em nossa experiência
espiritual. Uma vez que não vivemos mais governados pelo egoísmo sufocante, já
que fomos crucificados juntamente com Cristo; então a vida de Cristo passa a ser
o Pão diário e o apetite da nova criação.
A fome de significado que consome a nossa existência só poderá
ser satisfeita pela suficiência da aceitação de Deus em Cristo Jesus. Quando nos
apropriamos desta aceitação incondicional, pela fé, gerada através da Palavra de
Deus e doada por Jesus, nós nos tornamos como criancinhas em festa de
aniversário: alegres e descontraídas.
O Pão nosso de cada dia é uma iguaria celestial comida à mesa,
até mesmo com a presença dos adversários, ou seja: os opositores são
transformados em amigos pelo milagre da aceitação. Não existe mais medo do
colidente. Preparas-me uma mesa na presença dos meus adversários, unges-me a
cabeça com óleo; o meu cálice transborda. Salmos 23:5.
Não há inimizade inflexível no coração do Anfitrião na casa da
Misericórdia. Além do que, o preço do ingresso foi pago integralmente e o
convite é genérico. Não há desculpa, pois não há mais nenhuma oposição que possa
dissuadir a universalidade do amor incondicional. O chamado da graça ao banquete
é ecumênico.
Por outro lado, amigo convidado, não me venha com a sua marmita
preparada em sua casa, nem espere pelas “quentinhas” servidas nos presídios. O
Pão nosso de cada dia é-nos dado no descanso da alma pela suficiência do dono da
Casa. Inútil vos será levantar de madrugada, repousar tarde, comer o pão que
penosamente granjeastes; aos seus amados ele o dá enquanto dormem. Salmos
127:2.
Quero enfatizar: o seu saber, o seu fazer, o seu ter, bem como
a sua religião não vão lhe satisfazer a fome da sua alma. Jesus foi enfático com
o seu povo. Este é o pão que desceu do céu, em nada semelhante àquele que os
vossos pais comeram e, contudo, morreram; quem comer este pão viverá
eternamente. João 6:58.
François Fenelon disse: “é fácil confundir curiosidade
intelectual com fome espiritual”. Se tivermos fome espiritual de fato; só o Pão
nosso nos satisfará diariamente.
Solo Deo Glória
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
domingo, 6 de maio de 2012
O PÃO NOSSO DE CADA DIA
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