O melhor juízo para avaliar uma vida espiritual, não é seu
enlevo ou arrebatamento, mas sua obediência voluntária. No cristianismo
autêntico, a fé e a obediência são sinônimas. O destaque da fé salvadora não
incide em quanto você acredita, mas em como você age em relação ao que você crê.
Como afirma J. Blanchard, a obediência não é a essência de um relacionamento
correto com Deus, mas a evidência desse relacionamento. Nem todo o que
diz: Senhor, Senhor! Entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de
meu Pai que está nos céus. Mateus 7:21.
O pecado tornou o homem num ser geneticamente rebelde. Há uma
revolta inata contra a vontade de Deus no coração do homem natural, pois a
essência do pecado é a rejeição ao senhorio divino e a insubmissão à vontade de
Deus. O levante da iniqüidade produziu uma raça indisciplinada e desobediente,
que insurge contra aquilo que Deus estabelece como fundamental para o
desenvolvimento de uma vida equilibrada e sadia, e assim, essa obstinação só vem
avultar a ira de Deus contra a resistência do homem. Ninguém vos engane
com palavras vãs; porque, por estas coisas, vem a ira de Deus sobre os filhos da
desobediência. Efésios 5:6.
Ora, se o cerne do pecado é a rebeldia, a essência da salvação
é a obediência. Ninguém pode considerar-se salvo por Jesus Cristo se continua
sendo birrento em relação às leis de Deus. Todo cristão verdadeiro obedece
naturalmente os sinais de trânsito na estrada apertada que se destina ao céu,
uma vez que sua nova natureza, agora, está equipada com o propósito dócil de
fazer a vontade de seu Pai celestial. Agrada-me fazer a tua vontade, ó
Deus meu; dentro do meu coração está a tua lei. Salmo 40:8.
Muita gente nobre, para fugir do equívoco da salvação através
da obediência à lei, denominada salvação pelas obras, tem desabado no erro
oposto da salvação, sem obediência à lei. Todavia, onde a norma da palavra de
Deus é soberana, o normal é obedecê-la normalmente, como bem sustenta
George Swinnock: Onde o correto é absoluto, a obediência não pode ser
condicional. A fé que salva é uma fé que obedece de modo habitual e
voluntário, pois antes de serem atos do homem, a fé e a obediência são
dons de Deus, equipando os salvos para uma vida de submissão natural.
No coração, tem ele a lei do seu Deus; os seus passos não vacilarão. Salmo
37:31.
Mas, é conveniente lembrarmos aqui, que é só pela graça de Deus
que o salvo pode obedecer às leis de Deus livremente. Não há qualquer
possibilidade de uma obediência voluntária pela pessoa escrava do pecado,
tampouco a aquiescência humilde dos salvos à vontade de Deus, sem a perfeita
atuação da graça. Sabemos que a graça é o único instrumento do evangelho capaz
de humilhar o ser humano, arrogante pelo pecado, sem, contudo, degradá-lo, como
também, é o único meio capaz de engrandecê-lo, sem torná-lo presunçoso.
Mas, pela graça de Deus, sou o que sou; e a sua graça, que me foi concedida, não
se tornou vã; antes, trabalhei muito mais do que todos eles; todavia, não eu,
mas a graça de Deus comigo. 1 Coríntios 15:10.
A obediência que se origina através da graça é a obediência de
um filho que crê, e nunca de um escravo alarmado que se submete com medo. No
evangelho de Jesus Cristo não há servidão a um legalismo dominante, mas plena
submissão graciosa à lei divina. Nenhuma graça é mais poderosa do que a
obediência voluntária em profunda humildade, como no caso adequado, no exemplo
de Jesus: Porque eu desci do céu não para fazer a minha própria vontade, e
sim a vontade daquele que me enviou. João 6:38.
A obediência à vontade de Deus não é matéria alternativa na
vida de um cristão, uma vez que a obediência a Deus é a prova mais infalível
de um amor sincero e supremo por ele, como ensina Nathanael Emmons. O
ABC do obedecer começa exatamente no amor. Aquele que obedece movido unicamente
pelo temor, jamais conheceu o significado do verdadeiro amor. No reino de Deus
obediência e amor andam entrelaçadas de tal forma que a apresentação de uma,
sugere a presença do outro. Grande paz têm os que amam a tua lei; para
eles não há tropeço. Salmo 119:165.
O amor e o medo se repelem mutuamente, sobretudo na questão da
obediência. Não é possível alguém obedecer com medo, movido pelo amor. O medo
existencial é fruto da incerteza do amor incondicional de Deus. Muitos até
tentam obedecer agitados pelo medo, por desconhecerem as profundezas do amor
divino, mas, enquanto o temor faz da obediência uma obrigação pavorosa, o amor
torna o cumprimento dos preceitos divinos um costume favorável e isento de
apreensão. No amor não existe medo; antes, o perfeito amor lança fora o
medo; logo, aquele que teme não é aperfeiçoado no amor. 1 João 4:18.
A obediência sem amor é uma imposição cruel do dever cruciante,
pois quase nada pode ser mais incômodo do que a obrigação destituída de amor.
Alguém disse: Seja o que for o amor, ele não pode ser passivo,
opressivo nem possessivo. Toda observância impulsionada simplesmente por
mero compromisso, sem a menor afeição, não passa de uma ditadura do
constrangimento, compelida aos escravos de prestígio. Todos os vossos atos
sejam feitos com amor. 1 Coríntios 16:14.
Ora, se o amor é a chave da obediência, a brandura é o seu
estilo. Ninguém pode obedecer significativamente os mandamentos divinos com o
espírito áspero e contrariado. A prática da vida cristã não se constitui de
simples comportamento formal, pois que a conduta dos legítimos filhos de Deus é
uma conseqüência da atitude humilde de um coração submisso à vontade do Pai.
Obedecer de má vontade é seguramente uma coação. Mas graças a Deus porque,
outrora, escravos do pecado, contudo, viestes a obedecer de coração à forma de
doutrina a que fostes entregues. Romanos 6:17.
No fundo da submissão cristã encontra-se uma atitude de
suavidade que sempre caracteriza as pessoas alcançadas pela graça. Elas não
obedecem simplesmente coagidas por uma resignação sem qualquer alternativa, mas
movidas pelo discernimento de terem sido aceitas incondicionalmente pela graça,
preferem obedecer tudo o que Deus determina, com mansidão. Se a obediência é
feita sob pressão ou conquistada na base dos interesses, não se trata da genuína
experiência do evangelho. Então, Pedro e os demais apóstolos afirmaram:
antes, importa obedecer a Deus do que aos homens. Atos 5:29. Em razão do
contexto, nós podemos dizer que eles aqui foram firmes, jamais rudes ou
deselegantes.
O amor determina o propósito da obediência e a brandura
estabelece o estilo, mas o contentamento expressa o estado da alma. A
verdadeira obediência da fé é uma obediência alegre, insistia
Thomas Watson. Nenhum cristão autêntico pode sonegar o
contentamento, quando faz aquilo que é a vontade do seu Pai. J.
Blanchard vai mais adiante ao afirmar que a alegria é o
resultado natural da obediência do cristão à vontade de Deus revelada.
Se não há prazer no cumprimento dos mandamentos de Deus, não há qualquer
valor espiritual numa obediência contrariada, porquanto os filhos de Deus têm
prazer nos seus preceitos. Suspiro, Senhor, por tua salvação; a tua lei é
todo o meu prazer. Salmo 119:174.
Sem alegria, a obediência desanda numa verdadeira tortura, uma
vez que o descontentamento, com freqüência, acaba abrutalhando os sentimentos e
empedernindo o corpo. Por outro lado, o contentamento sempre engraxa as
engrenagens da alma, tornando a pessoa mais suave, sem, contudo, fazê-la
complacente com a justiça da lei. O contentamento tem a capacidade de
transformar um sujeito pobre numa pessoa rica, enquanto o descontentamento acaba
convertendo os ricos em pobres miseráveis. O maior patrimônio de alguma pessoa
consiste em viver contente, cumprindo, com alegria, a vontade de Deus.
Mais me regozijo com o caminho dos teus testemunhos do que com todas as
riquezas. Salmo 119:14.
Amor, brandura e contentamento formam o ABC daquilo que
denominamos o obedecer inteligente. Toda obediência fora desse padrão, com
certeza acaba virando uma obrigação insuportável, madrinha de um comportamento
puramente protocolar do mero farisaísmo legalista. Saul não levou a sério o ABC
da obediência e com seu porte de monarca tentou burlar a seriedade do assunto,
com o enredo ritual da diplomacia política. Mas o profeta Samuel, como se diz
popularmente, não entrou na dele e pisou fundo. Porque a rebelião é como o
pecado de feitiçaria, e a obstinação é como a idolatria e culto a ídolos no lar.
Visto que rejeitaste a palavra do Senhor, ele também te rejeitou a ti, para que
não sejas rei. 1 Samuel 15:23.
O reverendo Vance Havner costumava sustentar o seguinte ponto: carregar a cruz e obedecer aos mandamentos do Senhor são cláusulas que não estão anotados no rodapé do documento, com letras minúsculas que carecem de lupa, mas escritas em negrito, bem na capa do contrato. Cristianismo é obediência, mas obediência em amor, brandura e contentamento. Assim, aquele que obedece sinceramente segundo os princípios elementares do ABC, acaba obedecendo em sua maior abrangência. Como dizia João Calvino, não podemos descansar nas promessas de Deus sem obedecer a seus mandamentos. Ensina-me, Senhor, o caminho dos teus decretos, e os seguirei até ao fim. Salmo 119:33.
Solo Deo Glória
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
quinta-feira, 10 de maio de 2012
O ABC DO OBEDECER
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