segunda-feira, 18 de junho de 2012

A IGREJA NA CONTRAMÃO DA HISTÓRIA

"Fiz o primeiro relato, ó Teófilo, acerca de tudo o que Jesus começou a fazer e a ensinar, até o dia em que foi elevado ao céu, após ter dado orientações, pelo Espírito Santo, aos apóstolos que escolhera." Atos 1.1-2.
Após a morte de Saul, tudo estava desarrumado para Davi. Ele precisava dar novos rumos a Israel. Na tarefa de consolidar o reino de Israel e derrotar os inimigos de Israel, Davi precisou contar com o apoio de todas as doze tribos. O autor de I Crônicas 12, diz que os guerreiros de todas as tribos vieram até em Hebrom para "transferir a ele (Davi) o reino de Saul conforme a Palavra do Senhor". (v.23)
Davi recebeu dos guerreiros poder militar, e toda sorte de apoio do povo. No meio dos nomes dos que vieram ajudar a Davi, encontra-se um profundo comentário. A tribo de Issacar enviou duzentos chefes ao novo rei "entendidos na ciência dos tempos, para saberem o que Israel devia fazer". Esta é também uma necessidade que existe entre o povo de Deus em todas as gerações. Como o povo de Israel, a Igreja precisa compreender o momento histórico e saber o que fazer.
Entre a Igreja Primitiva e a Igreja dos dias atuais, muitos fatos e acontecimentos ocasionaram transformações no Cristianismo. Isto porque, a Igreja não acontece em um vácuo histórico. Nestes quase dois mil anos o Cristianismo incorporou valores, tradições, rituais e costumes que nunca estiveram no coração de Deus.
Uma coisa é certa, o momento presente, no qual a Igreja de Cristo vive e trabalha é fundamentalmente diferente de uma geração atrás. Na nova realidade, a Igreja está marginalizada. Segundo Loren Meal autor do livro "A Igreja de outrora e o Futuro" o chamado Paradigma da Cristandade já passou. Ele explica que a Igreja Primitiva, pensava e agia a partir do Paradigma Apostólico. A Igreja sabia a distancia entre ela e a comunidade. Sua missão era cruzar as fronteiras missionárias, a fim de definir a sua posição.
Contudo, com o Imperador Constantino, foi desfeita a fronteira existente entre a Igreja e o ambiente em que ela se encontrava. O ambiente tornou-se favorável a Igreja. Nasceu o chamado Paradigma da Cristandade, o qual dominou desde a Reforma até o século passado.
O Paradigma da Cristandade está morrendo. Estamos vivendo em um período intermediário enquanto um terceiro paradigma se forma, o Paradigma Missional. A fronteira entre a Igreja e o seu ambiente foi distanciada, formando uma mentalidade de gueto e está claro que vivemos em pleno campo missionário. Infelizmente muitas de nossas igrejas permanecem com uma forma ultrapassada de pensar em que esperamos que naturalmente os nossos vizinhos, amigos venham até nós, aprendam nossos modos e hábitos e entrem em nossa subcultura.
Portanto, faz-se necessário uma mudança em nosso entendimento de Igreja e seu ministério. Se não enxergarmos esta realidade vamos falar somente para os de dentro, e conseqüentemente, exercer sua influência cada vez menor no mundo.
Porém conhecer e entender o processo histórico não é suficiente, precisamos saber o que fazer. Isto implica voltarmos para as Escrituras e ver como foi o padrão estabelecido por Deus. Necessitamos voltar às origens, mesmo porque, as nossas circunstâncias se parecem muito com o período da Igreja Primitiva.
Na perspectiva missional é preciso ter os olhos voltados para as Escrituras e para a realidade. O livro de Atos mostra um padrão do ser e fazer. Nele encontramos lições redentoras, transformadoras e inspiradoras para andarmos na contra-mão da História.
Foi Lucas quem escreveu Lucas e Atos. No início era um livro só. Somente depois de 150 anos foram separados. Porém, o livro de Lucas e Atos precisam ser lidos juntos. Eles se complementam. Eles têm a mesma lógica, a mesma proposta. Foram escritos a partir do ano 80 d.C. A questão é: porque depois de 50 anos após a morte de Jesus, Lucas decide documentar e registrar a história de Jesus Cristo?
Depois de 50 anos da morte de Jesus, havia uma profunda frustração messiânica. Muitos passaram a julgar que Jesus fora um Messias que não dera certo. As idealizações e expectativas de muitos cristãos tinham caído por terra. O fato que agravou ainda mais foi a perseguição contra os judeus no ano 70 da era Cristã. Isso provocou mais dúvidas se Jesus realmente era digno de ser seguido.
A proposta de Jesus Cristo ia na contramão das expectativas do messianismo. Ele é pacifista. Acreditava-se que Israel era a nação eleita para ser luz das nações. O Messias veio e não fez nada para mudar a realidade. Havia uma frustração apocalíptica. Muitos questionavam se valia à pena manter a crença ou não na seita de Jesus Cristo. O que Jesus ensinou é viável? Vemos ainda muitas pessoas questionando se o que Jesus veio trazer funciona mesmo. Se o cristianismo realmente é verdadeiro e relevante!
Lucas inicia o livro de Atos endereçada para o mesmo destinário do seu primeiro livro. Fiz o primeiro tratado, ó Teófilo, acerca de tudo que Jesus começou, não só a fazer, mas a ensinar. Atos 1:1. Quanto a este ninguém sabe explicar muito bem. O "que Jesus começou a fazer e a ensinar". O que Lucas quer dizer com isso? No seu Evangelho, ele conta a história de Jesus desde a sua encarnação até sua trágica morte. Contudo, Lucas quer reafirmar a Teófilo que Jesus continua fazendo e ensinando no mundo. Agora, não como o Jesus encarnado, mas como o Jesus ressurreto.
A palavra-chave para a compreensão da importância do livro de Atos é a palavra "começou". Aquele Jesus amoroso, gentil, incomparável, o qual se preocupava com os perdidos, com os pobres,com as crianças, segundo Lucas ainda continuava fazendo e ensinando. Ele reafirmou para Teófilo que por meio de sua ressurreição Ele veio viver em seus discípulos promovendo transformação.
Lucas demonstra que Jesus é o grande Protagonista. Tanto em Lucas como em Atos Jesus está vivo na sua Igreja, o seu Corpo na terra. Em Jesus a religião acaba, porque Deus deixa de ser buscado lá longe. Ele é derramado em nós. Vivemos em Cristo. "Porque eu vivo, vós também vivereis. Naquele dia, vós conhecereis que eu estou em meu Pai, e vós em mim, e eu, em vós... Se alguém me ama, guardará a minha palavra; e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada". João 14:19-23. Uma experiência profunda com Jesus, que está vivo, nos capacita a sermos utilizados como seus instrumentos.
Isto pode ser ilustrado pela vida do apóstolo Paulo. Paulo é um dos principais instrumentos do Senhor Jesus no livro de Atos. Mas se quisermos entender o que realmente estava acontecendo na vida e no ministério de Paulo, é preciso ler o que se encontra em Romanos 15:18-19. "Eu não arrisco falar de qualquer coisa, exceto o que Cristo operou através de mim para conquistar os gentios à obediência, por palavra e por ação, pelo poder de sinais e prodígios, pelo poder do Espírito Santo". Paulo está dizendo: "Cristo trabalha através de mim por palavra e ação". Ou seja, Jesus está falando e agindo através da minha vida.
"Tudo posso naquele que me fortalece". Filipenses 4:13. Observe que Paulo, não fala: "Tudo posso junto com Aquele", mas, "naquele". Esta é a experiência de quem viu em Jesus um Salvador perfeito e Senhor suficiente. E por outro lado, reconheceu a sua miserável condição de pecador e incapacidade de conduzir a sua própria vida. Este é o primeiro passo para pertencer ao time do Senhor Jesus. Esta experiência de redenção, restauração e mudança de rumo, chama-se Novo Nascimento.
Muitos não tem experimentado o impacto transformador do Cristianismo simplesmente porque nunca nasceram de novo. Acostumaram com o conjunto de crenças, usos e costumes , mas o coração não foi invadido pelo Espírito Santo. Não aprenderam na prática um dos fundamentais ensinamentos de Jesus: "Se alguém não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus... quem não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus". João 3:3-5. O resultado é que continuam andando no caminho errado, seguindo o fluxo natural de uma vida dominada pelo pecado, pelo ego e por Satanás.
Cristianismo significa mudança de paternidade, de valores e de atitudes. Qualquer que é nascido de Deus não comete pecado; porque a sua semente permanece nele; e não pode pecar, porque é nascido de Deus. I João 3:9. Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não peca; mas o que de Deus é gerado conserva-se a si mesmo, e o maligno não lhe toca. I João 5:18. Pessoas regeneradas são moralmente distintas do mundo vivem em um processo de santificação contínuo. Atos e atitudes santos.
Quando isto acontece o movimento é totalmente contrário ao padrão humano. Ao invés que querer subir, será descer. Ao invés de estar no topo da pirâmide, o desejo é estar na base. Ao invés ser servido, servir. Foi isto que escandalizou os religiosos e continua a nos escandalizar. Jesus andou na contramão em todos os sentidos porque estava focado na cruz, ou seja uma vida de renúncia. Sua vida e toda a trajetória tinha um alvo a cruz. A cruz não é somente para pecadores. Pois Jesus não tinha pecado. A cruz é uma prova para pessoas obedientes. "Porque eu, mediante a própria lei, morri para a lei, a fim de viver para Deus. Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus , que amou e a si mesmo se entregou por mim." Gálatas 2:19-20. Se queremos ser instrumentos nas mãos de Deus, além do novo nascimento necessitamos fazer uma opção por andar na contra-mao do mundo, ou seja, uma decisão voluntaria para uma vida de renúncia de nos mesmos.
No novo nascimento passamos a ter a Trindade morando dentro de nós. Mas ter um relacionamento vivo, dinâmico e renovador com a Trindade trata-se de uma decisão de assumir constantemente a nossa condição de estar crucificado com Jesus Cristo. Temos, porém, este tesouro em vaso de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não de nós. Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não desanimados; perseguidos, porém não desamparados; abatidos, porém não destruídos; levando sempre no corpo o morrer de Jesus, para que também a sua vida se manifeste em nosso corpo. Porque nós, que vivemos, somos sempre entregues à morte por causa de Jesus, para que também a vida de Jesus se manifeste em nossa carne mortal". II Coríntios 4:7-12. O apóstolo Paulo demonstra que a fonte do poder para vivermos e cumprirmos a missão vem somente de Deus.
A Igreja precisa perceber que Cristo continua a realizar o seu trabalho com o propósito de promover a Glória de Deus. Deus é quem está em missão; a Igreja é chamada para juntar-se à Deus em seu trabalho no mundo. A igreja não é um fim em si mesma. A Primeira Missão da Igreja é morrer para ela mesma para que a Glória de Deus seja manifesta.! Ela precisa perder a sua glória. Deus não deixa que ninguém usurpe a sua glória. As nossas tentativas sempre serão frustradas como já tem sido.
Ao analisar o texto de Atos 1:1-3, o pregador John Piper aponta três coisas que os crentes necessitam para poder andar na contramão da história. Primeiro os crentes precisam ser direcionados pelo Espirito Santo. "Após ter dado orientações, pelo Espírito Santo, aos apóstolos que escolhera." Atos 1:1-2. A segunda coisa é que eles precisam de convicção de que Ele está vivo e triunfante sobre a morte. Versículo 3: "Para eles, ele se mostrou vivo depois da sua paixão por muitas provas, aparecendo-lhes durante quarenta dias..." . A última coisa mencionada no versículo 3 é a de que eles precisam de mais instrução sobre o reino de Deus. Você vê isso no final do versículo 3: "... Aparecendo-lhes durante quarenta dias e falando do reino de Deus".
Diante da tão grande revelação que temos recebido, estamos andando na contramão da história ou estamos fazendo de nossas igrejas "resorts" espirituais de proteção e satisfação!!! O paradigma missional é marcado pelo princípio da cruz. É definido por uma vida de obediência e renúncia para fazer não a nossa vontade mas a vontade do Senhor da missão. A nossa tendência natural é a inércia, o comodismo, e "venha a nós". O princípio da cruz, corta a raíz do nosso eu e faz dele mil pedaços para movidos pelo Espírito de Cristo cheguemos até as pessoas que Cristo quer abençoar, salvar e restaurar. Tal como Cristo andou na contramão para nos salvar, Ele nos envia. "Disse Jesus: Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio". João 20:21.

Solo Deo Glória.

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