Já me assemelho a um odre na fumaça; contudo, não me esqueço
dos teus decretos. Salmo 119:83.
Odre defumado é odre envelhecido. Sou antigo, sou velho como
Davi, mas ainda não me esqueci do concerto da graça feito com Abraão. Os
decretos eternos ainda não foram substituídos. A graça nunca foi temporária ou
provisória. Por isso, o evangelho acaba escandalizando a religião construída na
esteira da história exalando a pecado e transpirando pelo esforço da carne.
Jesus foi consultado por uma turminha que achava esquisita a
falta do jejum entre os seus discípulos. Essa gente ardilosa apontava para os
discípulos de João e dos fariseus como sendo praticantes exemplares dessa
disciplina da alma, e indagava de Jesus a ausência desta matéria entre os alunos
do Mestre da Galiléia.
Jesus, porém, lhes disse: Podeis fazer jejuar os convidados
para o casamento, enquanto está com eles o noivo? Dias virão, contudo, em que
lhes será tirado o noivo; naqueles dias, sim, jejuarão. Lucas 5:34-35.
A partir desta resposta o Senhor lhes conta uma parábola bem
esclarecedora para mostrar o equívoco da religião do mérito. Ninguém tira um
pedaço de veste nova e o põe em veste velha; pois rasgará a nova, e o remendo da
nova não se ajustará à velha. E ninguém põe vinho novo em odres velhos, pois o
vinho novo romperá os odres; entornar-se-á o vinho, e os odres se estragarão.
Lucas 5:36-37.
Jesus vai tratar aqui nesta parábola de um modelo já
ultrapassado. O Judaísmo vigente em sua época era um sistema arquitetado no
tempo em que o povo Judeu estivera escravo na Babilônia. Tratava-se de um
recipiente formatado na mentalidade humanista e que havia se tornado arcaico e
sem qualquer significado para a realidade nova que estava em processo na vida da
nova comunidade da Galiléia.
A fé cristã em andamento não cabia neste odre enrijecido,
atrofiado e prestes a se romper com a expansão natural do mosto novo em sua
força efervescente. Um odre esclerosado e inflexível não suporta a dilatação
causada pelo frescor do vinho jovem. O sistema religioso do velho judaísmo não
aguentaria a amplitude da liberdade cristã.
Para Jesus, o vinho novo deve ser posto em odres novos [e
ambos se conservam]. Lucas 5:38. As novas do Evangelho devem ser
acondicionadas em odres novos. A greve de fome não pode subsidiar a fartura do
Pão. A tristeza do velório não consegue garantir a festa do casamento com a
sepultura escancarada. O modelo da obediência a fórceps sacado pela lei, nada
tem a ver com a obediência patrocinada pelo amor incondicional.
Nós precisamos entender a velhice de uma proposta, sem,
contudo, nos atrelar à terrível caduquice de qualquer sistema que tenha sido
condenado por Jesus. O Cristianismo, pelo tempo decorrido, já é um odre na
fumaça, todavia, é imperioso ver a sua atualidade. Vamos procurar descobrir aqui
aquilo que é permanente no estilo cristão; aquilo que foi introduzido pelos
adversários camuflados; e aquilo que faz parte do momento histórico.
A fé cristã já tem bastante tempo, mas continua jovem e
renovando-se. O que envelhece no processo é o religioso que nela foi implantado.
Há muitas coisas que foram adicionadas ao cristianismo que nunca fizeram parte
da sua essência. São apêndices exógenos que lhe têm maculado a sua história.
O permanente é o amor incondicional de Abba; é a Casa da
liberdade de um Amor sem limites e sem fronteiras. Os mandamentos da fé cristã
se reduzem a amar. O culto cristão é a festa da ágape em comunhão familiar,
conduzido pelos dons espirituais. A igreja, portanto, não se parece em nada com
uma sinagoga gerada na escravatura da Babilônia.
O odre judaico já se encontrava “mochibento” e seco. Este
sistema arcaico funcionava sob a influência política de uma hierarquia
sacerdotal conspurcada nas fortalezas de Anu, isto é, no panteão sombrio do deus
das trevas, fomentado pela filosofia humanista da confusa revolução lenta e
sutil de Ninrode. Vejamos Gênesis 10:10-11.
No tempo de Jesus, o judaísmo não tinha mais a Arca da Aliança
no lugar Santo do templo, mesmo assim, o Sumo Sacerdote entrava, anualmente, no
dia da purificação, naquele lugar Santo, para espargir o sangue no
propiciatório. Mas onde estava a Arca? O quê é feito do propiciatório? Era tudo
um teatro? Sim, não havia mais a realidade do culto.
O odre judaico fora estragado pela fumaça do humanismo
babilônico. O fogo ardente das vaidades havia coberto de fuligem a estrutura da
religião marcada pelas paixões carnais.
A Babilônia tem uma história longa com Israel. Abraão foi
retirado de lá, mas o velho babilonismo o perseguiu para tentar sequestrar o seu
sobrinho na conspiração dos quatro reis conta cinco. Gênesis 14. Além do que,
foi longa a demolição desta cultura na vida do patriarca. Do seu segundo chamado
em Aran até a oferta de Isaque no monte Moriá foram cerca de 45 anos de
desconstrução. Teria chegado ao fim? Que nada.
Essa historia do humanismo religioso tem outros episódios
insinuantes. Logo que o povo de Israel entrou na terra prometida, uma capa
babilônica aparece nos escombros tentando um dos descendente de Judá com seu
estilo das aparências. Acã foi seduzido pelo modelo esnobe do sobretudo que lhe
proporcionava uma boa imagem.
Vemos aqui neste episódio que a casca parece valer mais do que
o cerne. Este "espírito" babélico é o mundo dos modelitos e das grifes que se
preocupam com a fachada. Há um grande perigo com o julgamento baseado na conduta
externa, tanto no que diz respeito ao orgulho como a falsa humildade. As capas
da Babilônia dão status e as suas togas revelam poder. Por isso, muito
cuidado com as fatiotas, elas escondem perigos.
Vejamos a estratégia dos gibeonitas, um dos povos que habitavam
a terra prometida. Deus havia dito que todos os povos que moravam em Canaã
deveriam ser exterminados. Então, os habitantes de Gibeão usaram de uma
camuflagem para se manterem vivos. (Na boa hermenêutica, só a morte do velho
Adão pode garantir a ressurreição da nova raça).
Eles se vestiram de roupas velhas e traziam pães bolorentos e
odres gastos para dizer que vinham de um terra distante e que tudo aquilo era
novo quando eles saíram de sua terra, e que pretendiam fazer uma aliança com
Israel. Josué 9.
Com esta estratégia eles se passaram por estrangeiros distantes
e acabaram por fazer uma aliança com Israel. Josué e os anciãos não consultaram
ao Senhor e realizaram um pacto com eles baseado nas aparências. As roupas
gastas, os odres remendados e os pães embolorados foram as artimanhas da justiça
própria para engambelar os tolos.
Quando Josué e os lideres descobriram a farsa já era tarde.
Eles estavam sob a proteção de um juramento, e o único castigo foi torná-los
rachadores de lenha e carregadores de água, mas isto teve um custo alto. O
acordo descabido e a presença dos gibeonitas no meio do povo de Deus causou
consequências sérias. 2 Samuel 21:1-9.
As aparências enganam. A ética humanista é semelhante à ética
cristã na exterioridade, contudo, bem diferente em sua motivação e natureza. A
capa da Babilônia é de faixada, promovida pela justiça própria e a vanglória. O
que conta, neste caso, é a conduta correta e o estilo garboso, enquanto a ética
cristã se fundamenta no amor que procede da vida de Cristo que se manifesta no
coração da nova criatura em humildade e mansidão.
Olhando de fora os comportamentos de ambos parecem iguais, mas
analisando as intenções vemos uma abismo no meio. Um é forjado na justiça do
homem, todavia, o outro, no amor de Deus. O humanismo é quase perfeito na ética
estética, mas um desastre na ética intrínseca. O teatro é espetacular. A vida no
camarote é um caos.
O odre do judaísmo pós babilônico é do estômago de bodes e
encontra-se seco, duro e ríspido. O odre da igreja é construído pelas vísceras
do Cordeiro de Deus que se renovam cada manhã pelas misericórdias de
Abba. É um recipiente novo e que se expande no processo dinâmico da
história.
Enquanto o velho sistema se preocupa com o patrimônio terreno,
bem como os usos e costumes de uma sociedade amancebada com o mundo carrasco, a
nova comunidade emancipada focaliza-se no Bem Supremo em favor das pessoas que
Deus ama.
A igreja é um povo em peregrinação rumo à Nova Jerusalém. É uma
coletividade viva e evolutiva que se renova sempre. É um corpo comunitário
governado pelo Amor Soberano que determina as funções de acordo com os dons
corporativos distribuído de modo bem equilibrado pelo Espírito Santo. Romanos
12:3-7.
Quando, no princípio da história cristã, a igreja ia quebrando
a casca do velho odre judaico e construindo o seu odre particular, ela teve que
viver muitos anos nas catacumbas, rompendo o sufoco do modelo controlador dos
judaizantes que nunca se deram por descartados deste contexto. Essa é uma
tiririca persistente, que depois de Teodósio conseguiu engessar, com toda a
armadura babilônica, a leveza da fé cristã.
O cristianismo romano retornou ao modelo arcaico do judaísmo
babilonizado e a igreja foi modelada no esquema do império decadente. Temos
assim um odre velho, hierarquizado, cheio de conchavos querendo manter o vinho
novo em expansão em seu sistema roto e enrijecido. Não era possível; daí as
muitas rebeliões.
A história da igreja mostra muitas tentativas de grupos
conscientes que buscavam a via de libertação e que foram sufocados como hereges.
Mesmo assim, um fogo de monturo sempre queimou por baixo dos escombros trazendo
a esperança de uma nova realidade.
A reforma foi uma estocada violenta no velho sistema,
entretanto, como dizia Dr. Purim, meu ilustre professor, "nós saímos do
catolicismo, mas o catolicismo não saiu de nós". O sistema protestante ainda
traz as vestes sacerdotais dentro de um clero esclerótico.
Precisamos de luz em nossa caminhada. Precisamos de uma visão
clara do modelo da graça plena. Precisamos encontrar aquele odre que permita o
desenvolvimento alegre com singeleza de coração em que se manifestem os quatro
suportes importantes para a preservação desse vinho novo. E perseveravam na
doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações. Atos
2:42.
Solo Deo Glória.
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
quinta-feira, 1 de novembro de 2012
O DESATRE DO ODRE VELHO (CONTINUAÇÃO)
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