O mundo é um campo de mutilados emocionais. Somos
uma raça estafada, extenuada e exaurida. Todos nós sofremos algum aleijão
psíquico. Paralíticos afetivos se arrastam no meio dos deficientes de
afabilidade, causando choques de relações. Todos nós somos carentes. Sentimos
necessidades básicas em nossas afeições. Sofremos com os traumas de rejeição e
não raro fazemos outros, vítimas de nosso mau-humor. Abusados freqüentemente
vingam-se daqueles que o feriram, castigando outros que nada têm com o caso. Um
ciclo de desforra se instala no processo de autocomiseração. Cada vítima se
sente no dever de reparar o sofrimento que lhe causaram. E cada represália abre
caminho para novos torturados que vão à revanche como torturadores. A cadeia de
atormentação faz parte de uma sucessão de mecanismos mórbidos que se desenvolvem
no estilo vingativo. Todas as vezes que enfrentamos o desagravo, instauramos um
procedimento de represália.
O ser humano é uma criatura enferma. O diagnóstico
bíblico é calamitoso. A cabeça toda está ferida, todo
o coração está sofrendo. Da sola do pé ao alto da cabeça não há nada são;
somente machucados, vergões e ferimentos abertos, que não foram limpos, nem
enfaixados, nem tratados com azeite. Isaías 1:5b-6.
Isto não é exagero. Pode ser que haja uma metonímia aqui, mas não uma hipérbole.
Concordamos que a linguagem é alegórica, mas não abusiva. Não há excessos. A
nossa raça encontra-se totalmente molestada. E as doenças sociais são mais
graves do que as moléstias orgânicas. Famílias deformadas acabam desestruturando
as personalidades. Igrejas doentes enfermam a membresia. Uma pedagogia
concorrente acaba desfigurando a saúde das relações. Tudo isso desemboca numa
máscara sofisticada de hipocrisia.
Alguém já disse que de todas as doenças, a pior
doença é daquele que nega sua própria doença. A cura é um assunto para doentes.
Só os enfermos podem recorrer ao tratamento. Jesus disse: Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Eu
não vim chamar justos, mas pecadores ao arrependimento. Lucas
5:31-32. Só os doentes podem ser sarados. Só os
pecadores podem ser salvos. Ninguém pode ser curado se não estiver doente.
Ninguém poderá ser salvo se não for pecador. Do ponto de vista espiritual, a
única coisa que posso oferecer para minha cura é a consciência da minha
enfermidade. A única coisa que posso oferecer para a minha salvação é o
reconhecimento do meu estado gravíssimo de pecado.
Quando o profeta clamou: Cura-me e serei
curado, salva-me e serei salvo, ele estava admitindo
a gravidade de sua doença e a necessidade de sua salvação. Ele representava a
voz da nação, que se encontrava atrofiada e profundamente enfermiça. Mas ele se
apresenta com uma confissão que se encaixa nos moldes da terapia. Aqui está
alguém que pode ser curado e certamente alguém que pode ser salvo. Aceitar sua
condição de malacafento é o primeiro passo para ficar sadio. Não podemos gozar
de boa saúde emocional se recusarmos demonstrar a seriedade de nosso achaque.
Fingir que somos fortes é um sintoma terrível de uma grave desordem psicológica.
A sociopatia é muito difícil de diagnosticar, pois o doente camufla os sintomas
com um jogo de simulações. A soberba é o indício claro de uma autopatia séria. A
teomania foi o primeiro impulso do pecado. Um ego inflamado
é insuportável para se conviver. Por isso, o tratamento começa com o
reconhecimento de nossa indisposição. Ao chegar diante de Deus, com a
predisposição de confessar que estamos gravemente machucados e seriamente
feridos, temos a garantia de sermos atendidos.
A misericórdia é um assunto para os miseráveis.
Somente quando reconhecemos o nosso estado de indignidade é que tocamos a
campainha do hospital divino. O socorro celestial se manifesta diante daquele
que clama pela cura, admitindo todas as feridas e contusões de sua alma.
Dois cegos estavam sentados à beira do caminho e, quando ouviram falar que
Jesus estava passando, puseram-se a gritar: "Senhor, Filho de Davi, tem
misericórdia de nós!" Mateus 20:30. A Bíblia
salienta que a multidão censurou os dois deficientes visuais, que passaram a
esgoelar ainda mais. Eles não ficaram intimidados com a reprovação dos
circunstantes, pois a necessidade da cura estava acima das repreensões. O berro
por valimento partiu da intensidade da angústia. Quando estamos sufocados com a
dor da alma, bradamos por adjutório. O padecimento nos encaminha ao consultório
da graça e assumimos sem falsidade nossa real situação. Tem compaixão de mim –
miserável pecador! O falido não teme revelar o seu estado arruinado, quando se
encontra diante de quem o acolhe sem reservas. A casa de saúde é a praça dos
adoentados. O pronto socorro é posto dos acidentados. A igreja é a clínica dos
estropiados. Não há melhor lugar para tratar dos inválidos emocionais do que na
verdadeira igreja de Jesus Cristo, pois todos os componentes desta comunidade
são doentes em recuperação. Ninguém deve se considerar melhor do que outro. Esta
paráfrase de Mateus 7:3 pode ser bem clara
para o nosso entendimento. Por que você observa o
cisco que está no olho do seu irmão, mas não percebe o tersol que está fechando
o seu olho? Como uma pessoa com conjuntivite pode
implicar com o argueiro
do olho vizinho? AVai cuidar primeiro da sua dor-d’olhos e depois, venha tirar com carinho a pestana que caiu no olho do seu irmão. Thomas Brooks dizia: Quanto mais piedoso for o homem, mais misericordioso será. A igreja não é nada mais do que Cristo manifestando a sua misericórdia aos arruinados. Betesda significa a casa da misericórdia. Jesus foi, certa ocasião, a um tanque que tinha este nome. Ali costumava ficar grande número de pessoas doentes e inválidas: cegos, mancos e paralíticos. Eles esperavam um movimento nas águas. João 5:3. Jesus viu um homem entrevado, que há 38 anos esperava uma oportunidade para chegar às águas, pois o primeiro que mergulhasse ficava curado. Os paralíticos perdem para os cegos e mancos na corrida à piscina. Ele não tinha cadeira de rodas nem fazia parte da equipe da para-olimpíada. Ele estava travado em suas condições. Mas Jesus o viu. Quando o viu deitado e soube que ele vivia naquele estado durante tanto tempo, Jesus lhe perguntou: "Você quer ser curado?" João 5:6. O questionamento parece sem propósito. Parece, mas não é. Há muita gente que não quer ser curada. A doença serve de álibi. Precisamos de desculpas para responder a nossos fracassos. Muitos se escondem nos panos da mortalha, para explicar sua falta de realização. Jesus tocou no ponto nevrálgico. Foi aí que o homem revelou seu vitimismo. Disse o paralítico: "Senhor, não tenho ninguém que me ajude a entrar no tanque quando a água é agitada. Enquanto estou tentando entrar, outro chega antes de mim." João 5:7. É muito comum apelarmos para as circunstâncias. Os pacientes vitimados da doença de si mesmo, sempre procuram transferir para os outros a causa das suas desventuras. Culpamos a situação e criticamos as pessoas. Este é um espelho da crise emocional. Estamos lesados em nossos sentimentos e nos fazemos de coitados. Mas Jesus é o médico e psicólogo por excelência. Então Jesus lhe disse: "Levante-se! Pegue a sua maca e ande." Imediatamente o homem ficou curado, pegou a maca e começou a andar. João 5:8-9.
Todos nós podemos ser curados em nosso psiquismo.
Todos nós podemos chegar em Betesda, a casa da misericórdia, para recebermos o
tratamento de Cristo. Ninguém ficará excluído se chegar com disposição de
revelar-se ao único Terapeuta capaz de se compadecer de sua situação. Precisamos
manifestar todos os sintomas que nos angustiam. Confidenciar nossos segredos.
Admitir nossa amargura. Confessar nossa incredulidade diante do Senhor. Ele sabe
todas as coisas, mas o seu método clínico requer que nos abramos com ele em
total sinceridade e sem reservas. Cura-me, Senhor, e serei curado;
salva-me, e serei salvo, e a linguagem decorrente
desta operação será a saudável expressão de louvor. Uma das características de
uma pessoa salva e curada é o seu palavreado com a dicção do louvor. O discurso
de uma pessoa sarada é também um remédio para os outros doentes.
Há palavras que ferem como espada, mas a língua dos
sábios traz a cura. Provérbios 12:18. Se estivermos
sendo curados, devemos nos envolver com a cura dos outros traumatizados. Esta é
uma estratégia graciosa do evangelho, que só a graça nos pode capacitar. Como
enfermeiros do ministério da graça, oferecemos esta receita:
É ele quem perdoa todos os seus pecados e cura todas
as suas doenças. Salmo 103:3.
Solo Deo Glória.
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
sábado, 3 de novembro de 2012
A CURA DOS ESTROPIADOS
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