domingo, 5 de agosto de 2012

VENHA O TEU REINO, SEJA FEITA A TUA VONTADE

Jesus respondeu e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus. Jesus respondeu: Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e do Espírito não pode entrar no Reino de Deus. João 3:3,5.

De forma predominante, em geral, o que se entende com a leitura desse texto é a seguinte interpretação: Aquele que não tiver uma experiência de regeneração, ou seja, de morte e ressurreição com Cristo na cruz, ao morrer irá para o inferno e estará perdido eternamente, ao passo que quem experimenta o novo nascimento, ao concluir o último de seus dias aqui na terra, viverá eternamente no céu. Será mesmo esse o único sentido que o texto comunica? E o que está por traz dessa interpretação reducionista?

O texto fala muito mais que isso, no entanto este empobrecimento interpretativo além de causar grandes transtornos, não está na Igreja a pouco tempo. Ele apareceu como doutrina gnóstica já nos primórdios da era cristã, bem como com os desdobramentos filosóficos do platonismo, onde no primeiro caso a matéria é má e o espírito bom, fazendo com que a salvação seja, antes de qualquer coisa, uma redenção do espírito em relação ao corpo. E no segundo, mais elaborado, articula-se para criar um dualismo onde o mundo das ideias engloba a realidade concreta e de que o mundo sensorial e visível é enganoso e ilusório.

Por admitir essa interpretação rasa, o alcance do evangelho e da boa nova trazidos por Jesus Cristo ficam confinados à uma concepção medíocre e adoecedora. Note! Esta interpretação não é propriamente dita contrária ao Evangelho, mas é a periferia dele e que, portanto, se faz necessário uma releitura do texto à luz do Espírito das Escrituras, a fim de se descortinar um horizonte mais amplo e libertador.

Quando tomado pelo todo, aquilo que é somente periférico fomenta o aparecimento de pelo menos duas visões distorcidas. Aquela que impulsiona o pessimismo com o mundo, cuja piedade é fugir dele, celebrando a clausura e o isolamento como santidade e devoção. O que faz com que a vida imanente seja apenas uma avaliação, ou no limite, um palco onde o pretendente ao Reino metafísico atua mostrando toda sua resignação para com tudo aquilo que se pode tocar. Para estes tudo que existe é mal e pervertido. Nesse ambiente torna-se prudente esperar um futuro terreno pior e caótico.

Na outra, descendendo da mesma premissa, estão as várias concepções existencialistas, que advogam uma participação quase que irrestrita no mundo, pois como tudo está resolvido definitivamente por Cristo, basta o acionamento do conhecimento doutrinal, para que a vida seja continuada no Reino de Deus o qual encontra-se no além, visto que o mundo jaz no maligno, e que desfrutar dos poderes desse mundo agora torna-se meta de vida abençoada, já que essa esfera não compromete a outra.

Com a dualidade estabelecida de Reino de Deus lá em cima, mundo maligno aqui em baixo, e que dessa forma ambos jamais se tocarão, nada do que possa ser realizado aqui, pode suplantar o que Cristo garantiu e conquistou definitivamente na Cruz para mim lá. Para estes, funciona a máxima de que quanto maior o pecado, maior e mais eficaz graça. E o texto preferido a fim de sustentar essa mentalidade é o de Romanos 6:1b:Permaneceremos no pecado para que a graça seja mais abundante. Você leu corretamente! Pois nesse tipo de teologia, o texto deve estar em tom afirmativo e conclusivo, sem o ponto de interrogação.

Na Bíblia, os que são orientados pelo pessimismo histórico, podem ser identificados com os fariseus, enquanto aqueles que creem no desfrute do mundo de forma quase irrestrita, com os Saduceus.

O conceito “Reino dos Céus” aparece no Novo Testamento pela primeira vez na voz de João Batista em Mateus 3:2: Arrependei-vos, porque é chegado o Reino dos céus. E com a chegada desse Reino se desdobraria um novo horizonte para o futuro de Israel. Para a sua implementação o messias teria de colocar fim à história levando à cabo a era marcada pela injustiça, pela opressão e pelo domínio estrangeiro. Inaugurando um novo tempo, agora, edificado sob a justiça e com ausência de ambiguidades.

A promessa fala de um Reino onde não haverá doença, choro, dor, fome, guerra ou opressão. Enfim, trata-se de um Reino sem maldade, sem rebelião. Trata-se de um Reino sem morte, sem pecado, como podemos ler em Isaías 61:7,8: Em lugar de vossa vergonha, tereis dupla honra; em lugar de afronta, exultareis na vossa herança; por isso, na vossa terra possuireis o dobro e tereis perpétua alegria. Porque eu, o Senhor, amo o juízo e odeia a iniquidade do roubo; dar-lhes-ei fielmente a sua recompensa.

Contudo, esse cenário ocupado pela fé judaica, conhecida coma apocalíptica, trazia em si uma expectação de juízo onde o tempo seria inundado pela presença de Deus e que, portanto, os injustos e pecadores seriam definitivamente condenados. Por isso o censo de urgência de João Batista, ou seja, o seu anúncio era de que o arrependimento se fazia necessário e de forma imediata, pois com a chegada do Reino, não haveria tempo para mais nada, e que o próximo ato de Deus seria o de vingar os injustiçados, como podemos checar em Isaías 61:2a: a apregoar o ano aceitável do Senhor e o dia da vingança de nosso Deus.

Quando Jesus é anunciado no rio Jordão, como o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, o Batista o percebe como o messias que realizará a justiça e que fará vigorar eternamente a paz sobre o povo de Deus. Daí o porquê da sua grita pelo arrependimento, pois anuncia que depois dele, virá aquele que batizará com o Espírito Santo e com fogo, bem como toda a árvore que não produzir bom fruto, será cortada e lançada para ser queimada. João pregava que com a chegada do Reino, o julgamento seria pleno e imediato, e este sob os critérios e rigor da Lei.

Jesus após ter sido batizado e em seguida tentado no deserto, inicia seu ministério em Cafarnaum, reproduzindo a mesma mensagem que ouvira de João, porém, ao invés de julgar os pecadores, passa a comer com eles e ainda afirma que seu ministério é chamá-los ao arrependimento. Jesus cura um servo de um centurião romano, símbolo máximo da opressão à Israel, pois os centuriões são comandantes da guarda romana. Ou seja, João já preso e prestes a morte, oscila quanto à chegada do Reino de Deus e pede que seus mensageiros indaguem a Jesus sobre sua unção como messias. És tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar outro? Lucas 7: 19b.

Isto porque, o Reino de Deus não é inaugurado pelo juízo imediato que ele faz dos seres humanos, antes invade a história trazendo para dentro dela o juízo sobre si próprio. A pena que deveria ser sentenciada esmagando os pecadores é colocada agora sobre os ombros de Jesus. No Reino de Deus, Jesus sabe que para sua deflagração é necessário que toda a iniquidade, pecado, dívida e morte sejam tragadas pela vitória na Cruz, fazendo com que o dia da vingança recaia totalmente sobre o seu corpo moído no madeiro. Talvez isso seja que João desconhecia.

Sendo assim quando Jesus lê o profeta Isaías em Lucas 4:18-19, não mais menciona o dia da vingança, pois ali é proclamado que toda vingança seria atraída nEle, como cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, de modo que toda ira do Pai fosse aplacada pelo seu Filho em quem tem todo contentamento.

O Reino de Deus é, portanto, uma realidade escatológica, é a antecipação da realidade divina aos seres humanos. É a manifestação no tempo e no espaço do findar da velha criação, do término da rebelião, do fim do pecado, da morte da morte, e tudo isso, unicamente, através da morte do pecador com Cristo na Cruz. Nela Jesus foi posto para que nenhuma condenação mais fosse colocada sobre ser humano algum, pois quando morreu levou a nossa morte e quando crucificado nos atraiu.

A ressurreição de Cristo é a irrupção propriamente dita do Reino, é a manifestação do Espírito da Vida, é a implosão do poder da vida indestrutível no meu homem interior, é a renovação da mente, é a relativização de todos os poderes das trevas e mundanos. Quando a vida ressurreta opera, todos nós caímos de joelhos e reconhecemos que verdadeiramente Jesus Cristo é o Senhor absoluto e clamamos pelo seu Senhorio sobre nós.

A vida da ressurreição é a relativização do poder da “carne”, pois como Paulo anuncia em Colossenses 2:11-14: Nele também fostes circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da carne, que é a circuncisão de Cristo, tendo sido sepultados, juntamente com ele, no batismo, no qual também fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentro os mortos. E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando os nossos delitos; tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz.

Esta é a obra de Deus, que convida a toda humana criatura a participar de seu Reino, um Reino que suspende todos os outros reinos, onde Jesus Cristo é o Senhor. E aqui há de ser dito com todo força que este Reino não esta aberto a relativizações, ou você está nele e o vê desde dentro, ou está do lado de fora sem ainda contemplá-lo. Não advogue em causa própria, desejoso por uma salvação que lhe perdoe, mas que não te liberta. Não tente salvar-se tranquilizando sua consciência pelo conhecimento doutrinal. Ou Cristo é a sua vida ou ainda não morreu para o pecado.

Não. Mil vezes não! Jamais relativize Reino. Não tente argumentar que a graça lhe aceita como você é, pois ela lhe recebe como está, contudo, deseja fazer de ti conforme a imagem de Jesus, afim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos (Rm 8:29). O Reino é manifesto, é chegada a salvação, não pise o Filho de Deus nem profane o sangue do testamento com que foi santificado, fazendo agravo ao Espírito da graça (Hb 10:29). Que Reconheçamos o Senhorio de Jesus sobre nossas vidas. Que tomemos cada dia nossa cruz e o sigamos.

Solo Deo Glória.

Nenhum comentário:

Postar um comentário