Jesus respondeu e disse-lhe: Na verdade, na verdade te digo
que aquele que não nascer de novo não pode ver o Reino de Deus. Jesus respondeu:
Na verdade, na verdade te digo que aquele que não nascer da água e do Espírito
não pode entrar no Reino de Deus. João 3:3,5.
De forma predominante, em geral, o que se entende com a leitura
desse texto é a seguinte interpretação: Aquele que não tiver uma experiência de
regeneração, ou seja, de morte e ressurreição com Cristo na cruz, ao morrer irá
para o inferno e estará perdido eternamente, ao passo que quem experimenta o
novo nascimento, ao concluir o último de seus dias aqui na terra, viverá
eternamente no céu. Será mesmo esse o único sentido que o texto comunica? E o
que está por traz dessa interpretação reducionista?
O texto fala muito mais que isso, no entanto este
empobrecimento interpretativo além de causar grandes transtornos, não está na
Igreja a pouco tempo. Ele apareceu como doutrina gnóstica já nos primórdios da
era cristã, bem como com os desdobramentos filosóficos do platonismo, onde no
primeiro caso a matéria é má e o espírito bom, fazendo com que a salvação seja,
antes de qualquer coisa, uma redenção do espírito em relação ao corpo. E no
segundo, mais elaborado, articula-se para criar um dualismo onde o mundo das
ideias engloba a realidade concreta e de que o mundo sensorial e visível é
enganoso e ilusório.
Por admitir essa interpretação rasa, o alcance do evangelho e
da boa nova trazidos por Jesus Cristo ficam confinados à uma concepção medíocre
e adoecedora. Note! Esta interpretação não é propriamente dita contrária ao
Evangelho, mas é a periferia dele e que, portanto, se faz necessário uma
releitura do texto à luz do Espírito das Escrituras, a fim de se descortinar um
horizonte mais amplo e libertador.
Quando tomado pelo todo, aquilo que é somente periférico
fomenta o aparecimento de pelo menos duas visões distorcidas. Aquela que
impulsiona o pessimismo com o mundo, cuja piedade é fugir dele, celebrando a
clausura e o isolamento como santidade e devoção. O que faz com que a vida
imanente seja apenas uma avaliação, ou no limite, um palco onde o pretendente ao
Reino metafísico atua mostrando toda sua resignação para com tudo aquilo que se
pode tocar. Para estes tudo que existe é mal e pervertido. Nesse ambiente
torna-se prudente esperar um futuro terreno pior e caótico.
Na outra, descendendo da mesma premissa, estão as várias
concepções existencialistas, que advogam uma participação quase que irrestrita
no mundo, pois como tudo está resolvido definitivamente por Cristo, basta o
acionamento do conhecimento doutrinal, para que a vida seja continuada no Reino
de Deus o qual encontra-se no além, visto que o mundo jaz no maligno, e que
desfrutar dos poderes desse mundo agora torna-se meta de vida abençoada, já que
essa esfera não compromete a outra.
Com a dualidade estabelecida de Reino de Deus lá em cima, mundo
maligno aqui em baixo, e que dessa forma ambos jamais se tocarão, nada do que
possa ser realizado aqui, pode suplantar o que Cristo garantiu e conquistou
definitivamente na Cruz para mim lá. Para estes, funciona a máxima de que quanto
maior o pecado, maior e mais eficaz graça. E o texto preferido a fim de
sustentar essa mentalidade é o de Romanos 6:1b:Permaneceremos no pecado para
que a graça seja mais abundante. Você leu corretamente! Pois nesse tipo de
teologia, o texto deve estar em tom afirmativo e conclusivo, sem o ponto de
interrogação.
Na Bíblia, os que são orientados pelo pessimismo histórico,
podem ser identificados com os fariseus, enquanto aqueles que creem no desfrute
do mundo de forma quase irrestrita, com os Saduceus.
O conceito “Reino dos Céus” aparece no Novo Testamento pela
primeira vez na voz de João Batista em Mateus 3:2: Arrependei-vos, porque é
chegado o Reino dos céus. E com a chegada desse Reino se desdobraria um novo
horizonte para o futuro de Israel. Para a sua implementação o messias teria de
colocar fim à história levando à cabo a era marcada pela injustiça, pela
opressão e pelo domínio estrangeiro. Inaugurando um novo tempo, agora, edificado
sob a justiça e com ausência de ambiguidades.
A promessa fala de um Reino onde não haverá doença, choro, dor,
fome, guerra ou opressão. Enfim, trata-se de um Reino sem maldade, sem rebelião.
Trata-se de um Reino sem morte, sem pecado, como podemos ler em Isaías 61:7,8:
Em lugar de vossa vergonha, tereis dupla honra; em lugar de afronta,
exultareis na vossa herança; por isso, na vossa terra possuireis o dobro e
tereis perpétua alegria. Porque eu, o Senhor, amo o juízo e odeia a iniquidade
do roubo; dar-lhes-ei fielmente a sua recompensa.
Contudo, esse cenário ocupado pela fé judaica, conhecida coma
apocalíptica, trazia em si uma expectação de juízo onde o tempo seria inundado
pela presença de Deus e que, portanto, os injustos e pecadores seriam
definitivamente condenados. Por isso o censo de urgência de João Batista, ou
seja, o seu anúncio era de que o arrependimento se fazia necessário e de forma
imediata, pois com a chegada do Reino, não haveria tempo para mais nada, e que o
próximo ato de Deus seria o de vingar os injustiçados, como podemos checar em
Isaías 61:2a: a apregoar o ano aceitável do Senhor e o dia da vingança de
nosso Deus.
Quando Jesus é anunciado no rio Jordão, como o cordeiro de Deus
que tira o pecado do mundo, o Batista o percebe como o messias que realizará a
justiça e que fará vigorar eternamente a paz sobre o povo de Deus. Daí o porquê
da sua grita pelo arrependimento, pois anuncia que depois dele, virá aquele que
batizará com o Espírito Santo e com fogo, bem como toda a árvore que não
produzir bom fruto, será cortada e lançada para ser queimada. João pregava que
com a chegada do Reino, o julgamento seria pleno e imediato, e este sob os
critérios e rigor da Lei.
Jesus após ter sido batizado e em seguida tentado no deserto,
inicia seu ministério em Cafarnaum, reproduzindo a mesma mensagem que ouvira de
João, porém, ao invés de julgar os pecadores, passa a comer com eles e ainda
afirma que seu ministério é chamá-los ao arrependimento. Jesus cura um servo de
um centurião romano, símbolo máximo da opressão à Israel, pois os centuriões são
comandantes da guarda romana. Ou seja, João já preso e prestes a morte, oscila
quanto à chegada do Reino de Deus e pede que seus mensageiros indaguem a Jesus
sobre sua unção como messias. És tu aquele que estava para vir ou havemos de
esperar outro? Lucas 7: 19b.
Isto porque, o Reino de Deus não é inaugurado pelo juízo
imediato que ele faz dos seres humanos, antes invade a história trazendo para
dentro dela o juízo sobre si próprio. A pena que deveria ser sentenciada
esmagando os pecadores é colocada agora sobre os ombros de Jesus. No Reino de
Deus, Jesus sabe que para sua deflagração é necessário que toda a iniquidade,
pecado, dívida e morte sejam tragadas pela vitória na Cruz, fazendo com que o
dia da vingança recaia totalmente sobre o seu corpo moído no madeiro. Talvez
isso seja que João desconhecia.
Sendo assim quando Jesus lê o profeta Isaías em Lucas 4:18-19,
não mais menciona o dia da vingança, pois ali é proclamado que toda vingança
seria atraída nEle, como cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, de modo
que toda ira do Pai fosse aplacada pelo seu Filho em quem tem todo
contentamento.
O Reino de Deus é, portanto, uma realidade escatológica, é a
antecipação da realidade divina aos seres humanos. É a manifestação no tempo e
no espaço do findar da velha criação, do término da rebelião, do fim do pecado,
da morte da morte, e tudo isso, unicamente, através da morte do pecador com
Cristo na Cruz. Nela Jesus foi posto para que nenhuma condenação mais fosse
colocada sobre ser humano algum, pois quando morreu levou a nossa morte e quando
crucificado nos atraiu.
A ressurreição de Cristo é a irrupção propriamente dita do
Reino, é a manifestação do Espírito da Vida, é a implosão do poder da vida
indestrutível no meu homem interior, é a renovação da mente, é a relativização
de todos os poderes das trevas e mundanos. Quando a vida ressurreta opera, todos
nós caímos de joelhos e reconhecemos que verdadeiramente Jesus Cristo é o Senhor
absoluto e clamamos pelo seu Senhorio sobre nós.
A vida da ressurreição é a relativização do poder da “carne”,
pois como Paulo anuncia em Colossenses 2:11-14: Nele também fostes
circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da
carne, que é a circuncisão de Cristo, tendo sido sepultados, juntamente com ele,
no batismo, no qual também fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus
que o ressuscitou dentro os mortos. E a vós outros, que estáveis mortos pelas
vossas transgressões e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida
juntamente com ele, perdoando os nossos delitos; tendo cancelado o escrito de
dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era
prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz.
Esta é a obra de Deus, que convida a toda humana criatura a
participar de seu Reino, um Reino que suspende todos os outros reinos, onde
Jesus Cristo é o Senhor. E aqui há de ser dito com todo força que este Reino não
esta aberto a relativizações, ou você está nele e o vê desde dentro, ou está do
lado de fora sem ainda contemplá-lo. Não advogue em causa própria, desejoso por
uma salvação que lhe perdoe, mas que não te liberta. Não tente salvar-se
tranquilizando sua consciência pelo conhecimento doutrinal. Ou Cristo é a sua
vida ou ainda não morreu para o pecado.
Não. Mil vezes não! Jamais relativize Reino. Não tente
argumentar que a graça lhe aceita como você é, pois ela lhe recebe como está,
contudo, deseja fazer de ti conforme a imagem de Jesus, afim de que ele seja o
primogênito entre muitos irmãos (Rm 8:29). O Reino é manifesto, é chegada a
salvação, não pise o Filho de Deus nem profane o sangue do testamento com que
foi santificado, fazendo agravo ao Espírito da graça (Hb 10:29). Que
Reconheçamos o Senhorio de Jesus sobre nossas vidas. Que tomemos cada dia nossa
cruz e o sigamos.
Solo Deo Glória.
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
domingo, 5 de agosto de 2012
VENHA O TEU REINO, SEJA FEITA A TUA VONTADE
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