domingo, 1 de julho de 2012

CRISTÃOS A PARTIR DE CRISTO

“Mas o vinho novo deve ser colocado em odres novos, e ambos juntamente se conservam”. Lucas 5:38
Podemos identificar um sentimento crescente em algumas pessoas de que algo está muito errado, no que se refere à fé cristã em nossos dias. Já faz alguns anos que Deus tem conduzido alguns por um processo que tem como objetivo a desconstrução em relação à maneira como nós o percebemos, bem como a maneira como vivemos nossa fé. É um processo lento e espantoso, e Deus que é vida, usa das coisas simples da vida para operar em nós as mudanças que Ele deseja fazer.
Em meio às coisas simples da vida, gostaria de fazer referência a uma experiência pessoal, que, quando contada, não representa nada de extraordinário, talvez o que gostaria de dizer nestas linhas pareça obvio para alguns, ou de pouca relevância para outros, ou ainda, nem sequer represente uma novidade. Mas gostaria de correr este risco. Tenho a meu favor o argumento de que o óbvio, sempre nos coloca em dificuldades pelo simples fato de sua natureza óbvia. Pois muitas vezes aquilo que está debaixo de nossas narinas, constitui-se nas coisas que mais temos dificuldades de perceber.
A experiência acima citada aconteceu durante uma conversa, em uma de minhas viagens com o Pr. Glenio Paranaguá. Ele relatava algumas histórias de seus professores do seminário teológico. Entre tantos relatos, um me chamou muito a atenção, e desde então, tem feito parte dos meus questionamentos. Trata-se de uma sentença pronunciada por um de seus professores, Dr. Reinaldo Purin.
Essa sentença dita pelo Dr. Purin em 1968, afirmava que, “nós estamos no inicio da interpretação do cristianismo”. Não quero me ater muito em detalhes, mas temos de convir, uma afirmação desta, depois de quase 2000 anos de historia do cristianismo é no mínimo curiosa. Pensar que, passado todo este tempo, alguém ouse fazer tal afirmação, é motivo para, pelo menos, ouvir seus argumentos.
Sintetizando os argumentos do Dr.Purin, este fato se dá pela ascendência do cristianismo ser o judaísmo, e pelo fato de o cristianismo ter se transformado no catolicismo romano e o movimento da reforma protestante, por sua vez, não ter conseguido uma independência plena, em sua maneira de interpretar o evangelho. Dizia ele, “nós saímos do catolicismo, mas o catolicismo nunca saiu de nós”. Com isto, gostaria de pensar nesta questão a partir das escrituras.
Antes de pensar na afirmação de Jesus, “Mas o vinho novo deve ser colocado em odres novos, e ambos juntamente se conservam” gostaria de pensar um pouco no contexto destas palavras, pois este contexto age como um indicador da maturação daquilo que Jesus estava prestes a dizer. Jesus, através de algumas falas e de alguns atos, foi preparando o ambiente para que esta frase fosse dita, pois suas ações e palavras traziam como natureza intrínseca a novidade do Reino de Deus, algo assustador e desconcertantemente novo, que a convenção do vinho velho não queria e não iria aceitar.
Esta obstinada resistência ao novo é fruto da natureza pecadora do velho homem, quando humilhado pelo amor, pela graça e a verdade expressa no novo homem, no filho de Deus que é Cristo. Vendo no novo, tudo o que ele deveria ser, e não consegue; tudo o que ele diz ser, e não é, sendo vivido e manifesto sem esforço como algo natural à vida. Então o velho se submete à contradição, ao ódio e ao engano de si. Ao invés de se entregar à morte prefere matar, ao invés de se entregar ao amor do novo, prefere consolidar o ódio do velho, matando o novo num madeiro. “Ninguém tendo bebido o vinho velho, prefere o novo, pois diz: O velho é melhor.” Lucas 5:39
Da mesma forma hoje, dois mil anos depois a mesma cruz esta diante de nós, e podemos fazer parte da contradição da religião que em nome do autor da vida, determinam matá-lo, como Pedro diz diante dos obstinados da religião, oferecendo-lhes a misericórdia e a redenção: “Matastes o autor da vida, ao qual Deus o ressuscitou dos mortos do que nós somos testemunhas” Atos 3:15 Ou fazer parte dos humilhados e constrangidos pelo amor incondicional de Deus, que pela fé se identificam plenamente em Cristo, vendo em sua morte o fim de si mesmos, do velho, e em sua ressurreição o inicio do novo, isto é o que a bíblia chama de novo nascimento.
Jesus logo após a sua estada no deserto, onde foi tentado, começa seu ministério e logo de início manifesta as novidades, começa assumindo a sua missão que tem a ver com a liberdade, com a luz, com as boas novas e com a plena aceitação de Deus, e depois da leitura de Isaias diz; “Hoje se cumpriu esta escritura em vossos ouvidos” Lucas 4:21.
Todos estavam maravilhados com as palavras de sabedoria que saiam de sua boca, mas quando o novo se apresenta de maneira mais explicita, então tentam matá-lo. Quando ele faz referência a viúva de Sarepta de Sidom (v26), e quando ele faz menção de Naamã o sírio (v27), como alvos da instrumentalidade divina, o vinho novo aparece e por consequência o ódio do vinho velho também.
Poderíamos citar vários exemplos deste contexto que antecede a afirmação de Jesus sobre o vinho novo, mas vou citar apenas mais um, a vocação de Levi. Jesus depois de ensinar, curar o leproso, o paralítico expulsar demônios, realizar maravilhas, crescer em fama, sendo ostensivamente vigiado pelos fariseus resolve, numa ação explicita do vinho novo, se aproximar de um publicano chamado Levi, caminhar com ele e aceitar participar de um banquete em sua casa com seus amigos.
Para o vinho velho isto é uma afronta. Tal misericórdia e compaixão, tal manifestação de aceitação e expressão de amizade com alguém sem a mínima reputação religiosa, cercado de pecado e de pecadores, não pode ser de Deus. Deus jamais comeria com alguém assim e jamais amaria alguém como Levi e sua corja. Afinal de contas o deus do vinho velho, o deus criado pela religião, o deus da tradição religiosa do “não amor”, veio para os justos e perfeitos, enquanto o Deus revelado em Cristo Jesus diz; “...Eu não vim chamar justos e sim pecadores, ao arrependimento.” Lucas 5:32
Jesus no capitulo 5 de Lucas entre os versos 27 e 39, deixa claro a incompatibilidade que há, entre tudo que Ele é e representa, e seu acondicionamento ao velho sistema. Querer ser cristão e andar de mãos dadas com o sistema religioso do mundo é o grande erro do cristianismo. Querer interpretar o vinho novo, o evangelho, de maneira a conformá-lo com o odre velho da lei, do judaísmo, do paganismo e da coerência com a sabedoria deste mundo é um erro.
Quando agimos deste modo, promovemos tudo aquilo que inviabiliza a interpretação do cristianismo a partir de Jesus Cristo nestes dois mil anos de história, para as instancias acima citada; Cristo é escândalo e loucura. “...Mas nós pregamos a Cristo crucificado, que é escândalo para os judeus, loucura para os gregos. Mas, para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus.”1Cor 1:23 e 24. Esta realidade fica explicita em Pedro.
No capitulo dez de atos, a palavra de Deus nos fala sobre Cornélio, centurião descrito como piedoso e temente a Deus. Cornélio era romano, gentil, alguém que pertencia aos inimigos do povo de Deus, que não guardava o sábado, nem frequentava as sinagogas judaicas e que, segundo o vinho velho da religião era um maldito, pois estava escrito “Maldito todo aquele que não permanece em todas estas coisas escritas no livro da lei, para cumprir.” Gálatas 3:10b
Cornélio instruído pelo anjo, manda chamar a Pedro, para que viesse à sua casa anunciar o evangelho. Neste meio tempo o Pai deu uma visão a Pedro: um lençol com toda sorte de quadrúpedes, répteis da terra e aves do céu, determinando que fossem mortos e que os comesse, mas Pedro respondendo disse: “...De modo nenhum Senhor! Nunca comi coisa alguma comum ou imunda.”Atos 10:14 Deus então começa a ensinar a Pedro que as coisas mudaram, que agora é o tempo do vinho novo e que não dá mais para interpretar o novo a partir do velho. “...Não faças tu comum ao que Deus purificou” Atos 10:15
O nosso problema hoje, dois mil anos depois do início do cristianismo é o mesmo de Pedro no começo da igreja. A interpretação que fazemos do evangelho, ainda hoje, não parte do novo que é Cristo, mas sim, do vinho velho da religião. Pedro mesmo depois da instrução da visão, ao chegar à casa de Cornélio, não se sentiu confortável para entrar em sua casa. “Disse-lhes: Vós bem sabeis que não é licito a um judeu ajuntar-se, ou chegar-se a estrangeiros. Mas Deus mostrou-me que a nenhum homem chame comum ou imundo. Atos 10:28
Pedro era discípulo de Jesus, andou com Cristo, estava em Samaria quando Jesus conversou com uma mulher samaritana. Depois permaneceu em Samaria ainda dois dias, hospedado pelos samaritanos, amigos da mulher. Viu como Jesus entrou na casa de Levi, um publicano, como Jesus e seus discípulos comeram e beberam com os publicanos e pecadores. A pergunta é: Por que tamanho desconforto em entrar na casa de Cornélio? A resposta é simples, porque Pedro queria colocar vinho novo em odre velho. Sua interpretação do evangelho não era feita a partir do novo que é Cristo, mas a partir da caducidade de sua religião.
Quando olhamos para a história do cristianismo, talvez tenhamos que dar razão ao Dr. Purin. Hoje, o que podemos perceber é uma interpretação do evangelho que tem como mestres os expoentes da tradição religiosa “do não amor”, dos amantes da lei que crucificaram a Jesus, além dos mestres da Babilônia, que se deleitam em suas mistificações, cheios de ganância. Carecemos de uma interpretação do cristianismo, que tenha como mestre Cristo e Ele somente. Talvez este seja o momento histórico apropriado para o reinicio da interpretação Cristã. “...Este é meu filho amado, em quem me comprazo. A Ele ouvi!” Mateus 17:5.

Solo Deo Glória.

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