A soberba precede a ruína, e a altivez do espírito precede a queda. Em vindo
a soberba, sobrevém a desonra, mas com os humildes está a sabedoria. Provérbios
16:18 e 11:2
.
O Criador é a causa não causada que tudo causa sem ter nenhuma
causa que lhe tenha causado. A criatura é uma causa causada que nunca poderá ser
a causa que tudo causa. O Criador pode descer até o nível da criatura sem perder
a sua essência, mas a criatura nunca poderá alcançar o patamar do Criador. Javé
pode tomar a dimensão do homem, porém o ser humano encontra-se impossibilitado
de se tornar Deus.
Deus é o Criador. Ele criou os anjos entes imateriais e em
seguida a realidade física. O homem é um ser espiritual psicossomático
dirigindo-se pela via psicossocial. Na criação há um fato incorpóreo que
transcende à mecânica. Mesmo a física quântica que tenta explicar a energia
atômica não consegue elucidar a realidade desta vida espiritual. Lúcifer é anjo
e seu pecado é ingênito, isto é, incitado e gerado por ele mesmo ao se
confrontar com o Criador. Como criatura, ele não poderia ser o Criador, mas
sendo uma criatura dotada de cobiça poderia desejar ser Aquele que ele nunca
poderá ser. Ao se confrontar com o Criador a criatura Lúcifer desejou tornar-se
Criador, originando assim uma concorrência que acabou produzindo um conflito
complicado. A conspiração espiritual luciferiana teve ainda influência no mundo
atômico e os seres humanos acabaram sendo atingidos pelos efeitos da rebeldia
dos poderes metafísicos.
Deus é luz, e não há nele treva nenhuma. 1João 1:5b
.
Lúcifer é um anjo de luz que se tornou o príncipe do império das trevas. Elohim
o criou cheio de luz, mas como uma criatura finita. Quando ele caiu, em razão de
seu inconformismo, tornou-se a causa causada, causadora do império das trevas
que obscurece a compreensão humana.
No Jardim do Éden, o primeiro casal foi confrontado com a
possibilidade impossível de ser como Deus, sendo tentado nos seus desejos
teomaníacos. Como ensina a filosofia da cabala, o homem é o que deseja, por
isso, em vez da criatura ser apenas um reativo receptor da luz, ela passa a ser
um proativo desejando ser a luz. Ora se o Criador é luz, a criatura, do mesmo
modo, pode desejar ser a luz. Em termos práticos, o objetivo da tentação é
transformar a criatura de uma entidade reativa em uma entidade proativa. Aquele
que é o efeito pode desejar ser a causa não causada. O ser criado quer ser o
Criador. Aquele que é controlado pretende se tornar controlador e o que recebe,
anseia ser aquele que compartilha. Este é o objetivo final da vida proativa do
receptor humano, invadido pela inveja do pecado.
A realidade da conspiração tem como propósito eliminar o Pão da
Vergonha. Esta é uma expressão cabalística que demonstra todas as emoções
negativas ocorridas por um sucesso imerecido. Todo aquele que, abandonado pela
sorte, se vê obrigado a aceitar a caridade, está comendo o Pão da Vergonha. Mas,
o que se percebe nesse jogo é a arrogância da criatura contra o repouso da
graça. É o grito de independência ou sorte!
O apóstolo Paulo teve o discernimento do Espírito quando
mostrou com clareza o quadro tenebroso da estratégia maligna: Mas, se o
nosso evangelho ainda está encoberto, é para os que se perdem que está
encoberto, nos quais o deus deste século cegou o entendimento dos incrédulos,
para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, o qual é a
imagem de Deus. 2 Coríntios 4:3-4.
O ofuscamento espiritual é produto do deslumbramento do ego. A
venda do Príncipe das Trevas impede que o sujeito enxergue além do seu umbigo. E
assim, a miopia narcisista acaba afogando o dito-cujo num poço de lama na beira
da estrada. A proatividade em fazer por merecer e de ser a causa da sua
própria satisfação é a semente inchada do orgulho, que surge pela comparação e
se manifesta numa inveja explosiva e contrária ao Criador. Essa inveja
desencadeia uma competição de onipotência aguda, gerada no íntimo da criatura
inquieta ao buscar a sua independência de Deus.
Frederico Nietzsche dizia em um dos diálogos do personagem
apelidado de o Homem Feiíssimo, o seguinte: - como poderei admitir a existência
de Deus, se eu mesmo não for Deus também? Aqui reside o dilema da resistência
proativa. O pecado é o produto da inveja que não suporta ser menos do que Aquele
que é mais, maior e melhor.
A proatividade, neste caso, representa a
insuportabilidade das diferenças e desigualdades, enquanto a proposta de
igualdade do iluminismo testemunha de uma padronização invejosa. "Espelho,
espelho meu! Quem é mais bonito do que eu?"
Se eu não sou aquele que gostaria de ser, a minha admiração se
transforma numa crítica ridícula com o intuito de depreciar o outro, a fim de,
quem sabe, promover-me à pose invejada. A pretensa igualdade dos desiguais é o
lamento dos destroçados. Quem advoga a demolição do pináculo é sempre o fundo do
vale.
A lixeira se queixa por não viver no luxo e aposta em desbancar
quem ali vive. Ninguém aspira a ser a vala do esgoto, já que o partilhar
igualitário é o tema de quem só ambiciona ser o cume da montanha. Destarte, a
equidade torna-se - mutirão tapa buraco.
A pauta na agenda da alma rebelde é o jogo com o mais elevado.
O ego foi pervertido pelo desejo de competir. O que se define como o estímulo do
pecado é a energia usada para rivalizar-se com alguém em virtude das suas
diferenças. Os desafios são mais intensos do que a vitória, os riscos mais
empolgantes do que a certeza da conquista, pois a proatividade dá o sabor
de que o sujeito em ação é o ator principal da história. O pecado propõe tornar
a criatura em protagonista do drama existencial. Como atleta olímpica ela é
treinada com o objetivo de merecer a conquista e erradicar, deste modo, o Pão da
Vergonha. A graça é o maior insulto ao mérito. Jesus Cristo foi rejeitado como o
Pão Vil de um cardápio indigesto. É triste ver a humanidade erguendo escadas
para se projetar no cenário do alpinismo social.
Para os israelitas que saíram do Egito, o Maná foi considerado
como um pão bolorento e desprezível. Seria a graça barata? E o povo falou
contra Deus e contra Moisés: Por que nos fizestes subir do Egito, para que
morramos neste deserto, onde não há pão nem água? E a nossa alma tem fastio
deste pão vil. Números 21:5.
A graça ofende a auto-estima. Ganhar sem labutar reduz a
aquisição a alguma coisa detestável e dispensável. A esmola é um sinal de
desdouro pessoal. Viver da caridade é um ultraje inconcebível para os nobres e
esnobes deste planeta infestado de orgulho. O Maná tornou-se um prato enjoativo
para os que se dizem donos do mundo.
O pão nosso de cada dia nos dá hoje
é uma afronta ao
merecimento. Temos que nos empenhar sempre para fazer jus às conquistas que
marcham pela frente. Dizem: a herança recebida desestimula o espírito
empreendedor. Ganhar de graça é algo sem graça para o soberbo que exige o
reconhecimento dos seus esforços. Nada pode ser mais sem valor do que um prêmio
que não veio molhado de suor e envolto em dedicação.
Quarenta anos de Maná no deserto foi um tempo longo demais para
o fastio de uma geração que requeria um menu sofisticado e oneroso. Ser mendigo
e receber a esmola da graça é um insulto insuportável para toda essa gente
metida que prefere pagar caro pelo seu ingresso no espetáculo da plenitude da
vida.
Faço parênteses: o trabalho suarento é parte da penalidade do
pecado. Por causa da rebeldia adâmica todos têm que transpirar para conseguir o
pão diário. Todavia, o Maná aponta para Cristo, o alimento que sacia a fome
íntima de significado, dando-nos a identidade eterna de filhos de Aba. Este Pão
é absolutamente gratuito. Neste mundo os afazeres são sempre afanosos, mas a
carta de alforria dos escravos do pecado é de graça. Embora o progresso da vida
cristã demande diligência, o título da salvação é dádiva divina. A evolução
exige ânimo, se bem que apoiado pela graça. Muitos não entendem que o evangelho
é uma doação de cunho familiar. Jesus veio revelar que Deus é o Pai que tem
prazer em presentear graciosamente a todos os seus filhos enlameados. Veja essa
pegadinha bem humorada no livro de Ester: E, entrando Hamã, o rei lhe
disse: Que se fará ao homem de cuja honra o rei se agrada? Então, Hamã disse no
seu coração: De quem se agradará o rei para lhe fazer honra mais do que a mim?
Ester 6:6. Quanta presunção!
Hamã, que tipologicamente revela a carne, achava que ninguém
deveria ser mais importante no reinado de Assuero do que ele mesmo. Assim,
descreveu uma cerimônia pomposa e cheia de detalhes para a sua condecoração. Mas
veja o desfecho: Então, disse o rei a Hamã: Apressa-te, toma as vestes e o
cavalo, como disseste, e faze assim para com o judeu Mordecai, que está
assentado à porta do rei; e não omitas coisa nenhuma de tudo quanto disseste.
Ester 6:10.
Hamã caiu do cavalo. Eu também. O meu pecado me coloca numa
posição de destaque. Eu sou sempre proativo em meu favor. Gosto de me estimar
diante dos outros, ainda que esta atitude passe despercebida pela maioria, nunca
passará desatenta a Aba. Mas esta palavra em aramaico é a denominação de Pai,
revelada no evangelho da graça. Aba não é um empresário assalariando empregados
suados. Do mesmo modo não é um técnico exigindo desempenho dos seus atletas para
conquistar o torneio principal da temporada, a qualquer custo. Aliás, ninguém
monta no cavalo porque merece.
Tudo o que acontece na vida cristã é pela graça, até mesmo o
esforço. O galardão também é obra da graça. A proatividade dos filhos é
patrocinada e promovida pelo Pai. A graça é que nos faz agir de acordo com os
protocolos do Reino de Deus.
Na casa de Aba não há nenhum carrasco ou sargentão mantendo
todos sob a pressão do medo, nem gerente insistindo pela coação do resultado.
Porque não recebestes o espírito de escravidão, para viverdes, outra vez,
atemorizados, mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos:
Aba, Pai. Romanos 8:15.
A fé cristã é uma celebração em família e não a festa glamorosa
do Oscar premiando a gente ilustre do cinema. O evangelho não é uma recompensa
pelas conquistas, mas o usufruto exultante do amor incondicional do Pai. Ser uma
pessoa proativa no Reino de Deus não significa ser um executivo intransigente
exigindo desempenho. Crescer na graça é crescer graciosamente em Cristo à
maneira Dele, por meio Dele e para Ele. Glória, pois a Ele, eternamente. Amém.
Soli Deo Glória.
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
segunda-feira, 4 de março de 2013
O DILEMA DA PROATIVIDADE
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