Então, Pedro,
aproximando-se, lhe perguntou: Senhor, até quantas vezes meu irmão pecará contra
mim, que eu lhe perdoe? Até sete vezes? Respondeu-lhe Jesus: Não te digo que até
sete vezes, mas até setenta vezes sete. Mateus
18:21.
Certa ocasião C. S. Lewis disse:
“Todos consideram o perdão uma idéia muito bonita até precisarem perdoar
alguém”. Ray Pritchard, em seu livro O poder terapêutico do perdão
conta que recebeu um e.mail de um desconhecido que estava lutando para perdoar
aqueles que o feriram. Tratava-se de uma pessoa que, por causa de fatos
ocorridos em sua infância, vivia nutrindo raiva e ódio em seu coração. Era um
homem que havia sido abusado por um vizinho quando criança. Esse trauma, aliado
ao fato de não ter recebido carinho e atenção de seus pais, transformou a sua
vida num caos.
Eis um trecho daquilo que estava no
e.mail: “Só este ano, por meio da oração e da ajuda de um conselheiro cristão, é
que estou começando a deixar o passado para trás. Ainda tenho dificuldade de
lidar com a raiva, e talvez até do ódio, que sinto do meu pai. Precisei ir ao
cemitério visitar o túmulo dos meus pais e ter uma conversa de cerca de duas
horas com eles para começar a deixar para trás essa raiva que me manteve num
estado de tristeza constante ao longo de grande parte da minha vida adulta”
Ray relata que este homem tinha
prazer em ajudar as pessoas. Porém, julgava-se capaz de “consertar” pessoas e
problemas. Foi somente quando começou a confrontar os fatos de sua infância, sem
poder negá-los ou consertá-los é que pôde reconhecer que só Deus poderia fazer
isso. Esta foi sua primeira lição para aprender o que é perdoar.
Essa história ilustra muito bem como
o perdão é uma questão de disposição interior.
O perdão é fundamentalmente uma decisão interior de recusar-se a viver no
passado. É uma escolha consciente que nos levar a cortar os fios que nos prendem
ao passado e que, conseqüentemente, nos impedem de estar inteiros no presente.
Esses fios podem ser tão sutis, que nem nos damos conta de que eles ainda nos
mantêm ligados a um passado recente ou muito remoto. Experiências antigas deixam
marcas tão profundas em nossas vidas de tal modo que, mesmo não tendo
consciência delas, interferem em nossas ações cotidianas.
Na realidade, o perdão é uma questão
espiritual. O perdão começa no íntimo do coração para depois se manifestar
exteriormente. Em sentido profundo, todo perdão, mesmo aquele oferecido a alguém
que lhe causou grande mágoa, é algo entre você e Deus. As pessoas podem ou não
entender ou reconhecer esse fato. A questão do perdão é como um espelho fiel do
estado do nosso coração em relação à
compaixão, sensibilidade interpessoal e misericórdia. Por esta
razão, é um assunto tão importante para
todo cristão se aprofundar. Neste texto vamos analisar principalmente dois aspectos do perdão.
Primeiro, porque devemos perdoar e, segundo, porque podemos
perdoar.
O Senhor Jesus ensinou preciosas e
redentivas instruções sobre o perdão.
Para os rabinos da época de Jesus, o perdão deveria ser concedido a uma
pessoa até três vezes. O apostolo Pedro querendo ser mais generoso arriscou um
novo parâmetro: até sete vezes. Porém Jesus demonstrou o poder ilimitado do
perdão, setenta vezes sete. Em seguida contou essa
história.
Um homem que devia uma quantia
enorme (10.000 talentos) ao rei foi convocado para fazer um acerto de
contas. Com pernas trêmulas, dirigiu-se ao palácio, certo de que sairia de lá
para a prisão ou para o cativeiro. Devia ao seu senhor uma quantia que jamais
poderia pagar. As perspectivas mais sombrias se projetavam sobre ele e toda a
sua família. “Não tendo ele, porém, com que pagar, ordenou o senhor que fosse
vendido ele, a mulher, os filhos e tudo quanto possuía e que a dívida fosse
paga.” Mateus 18:25. Sua única esperança era saber que o rei gozava de
merecida fama por ser um governante misericordioso e justo. Então decidiu clamar
por misericórdia para que protelasse a cobrança de sua
dívida.
O rei fitou-o com profunda
compaixão, bem consciente de que o homem jamais conseguiria quitar a enorme
quantia, “mandou-o embora e perdoou-lhe a dívida”. Mateus 18:27. Saindo
do palácio, encontrou um companheiro que lhe devia uma pequena soma. De repente,
foi tomado de uma fúria incontrolável, “e, agarrando-o, sufocava, dizendo:
Paga-me o que me deves.” Então a cena se repetiu. O seu companheiro clamou
por misericórdia e pediu que prorrogasse a cobrança de sua dívida. “Ele,
entretanto, não quis; antes, indo-se, o lançou na prisão, até que saldasse a
dívida”. Mateus 18:31.
Algumas pessoas, que presenciaram as
duas cenas foram procurar o rei para relatar o acontecido. A reação do soberano
não se fez esperar. Mandando chamar de novo o homem que havia perdoado,
confrontou-o com sua maldade. “Que grande mal você praticou! Quando me
suplicou, perdoei a enorme quantia que me devia. Não seria de esperar que
mostrasse a mesma compaixão para com aquele que lhe devia uma quantia muito
menor?” Mateus 18:32-33. Assim, o rei ordenou aos guardas, que entregasse
aquele homem aos torturadores até que toda a divida fosse paga. O Senhor Jesus
conclui a história dizendo: “Assim também meu Pai celeste vós fará, se do
intimo não perdoardes cada um a seu irmão”. Mateus
18:35
Essa história, registrada em
Mateus 18:23-35, foi contada por Jesus para ilustrar a importância do
perdão. Não era a primeira vez que Jesus usava o conceito de dívida ao ensinar
sobre o perdão. Em Mateus 6:12, ele mostrou como devemos orar dizendo:
“Perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos
devedores.” No final da oração Ele deixa bem claro as conseqüências de não
perdoarmos a quem nos ofende. Se não perdoarmos, não seremos perdoados. E como
vimos na história do credor incompassivo, nosso destino será o de viver nas mãos
dos atormentadores.
Esta história revela a natureza e o
modo de agir de Deus. Expõe o coração cheio de misericórdia e compaixão de Deus
em comparação ao coração insensível, impiedoso e sem compaixão daquele que não
perdoa. A Bíblia demonstra que “Deus é grandioso em perdoar” Isaías
55.7. No salmo 130 lemos a seguinte indagação: “Se tu, ó Senhor,
observares as iniqüidades, ó Senhor, quem subsistirá? Mas contigo há perdão;
portanto és temido.” Salmo 130:4. O coração de Deus expressa a graça
que perdoa. Sendo assim, os filhos de Deus devem ser imitadores do Pai e do
Filho, sempre dispostos a perdoar. Como está a sua vida neste momento? Seu
coração está cheio de amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade,
mansidão e domínio próprio ou está cheio de inquietação, angústia, raiva,
ressentimento, amargura?
Na Sua parábola, Jesus mostrou
claramente que o homem não desejou perdoar seu conservo. Ele estava ensinando
que não perdoamos porque não queremos. “Querer” diz respeito à nossa vontade, à
maneira como agimos. Quando isso acontece estamos bloqueando a ação do Espírito
em nossa vida. A inquietação, a angústia, a raiva, o ressentimento e a amargura
são os atormentadores que se instalam em nosso coração para nos perturbar, e nos
impedir de gozar a liberdade que o perdão traz. Ressentimento ou raiva é o
“veneno” que mais tem destruído vidas no mundo em que vivemos.
Muitos dos problemas existentes a
nossa volta tais como: desentendimento familiar, falta de unidade e harmonia
entre cônjuges, pais e filhos, problemas de solidão, depressão, descontrole
emocional, vários casos de enfermidades psicossomáticas e até loucura, podem ser
conseqüências diretas da falta de perdão na vida de uma pessoa. “Perdoar é
libertar um prisioneiro e depois descobrir que esse prisioneiro é você
mesmo.”
Se quisermos ser verdadeiramente
inteiros e portadores de uma vida que
expresse a vida de Cristo temos que reavaliar os nossos sentimentos em relação
aos outros. Quando Jesus usou a palavra dívida, quis mostrar um aspecto
fundamental do ato de perdoar. A palavra grega traduzida como “perdoar”
significa literalmente cancelar ou remir. Significa a liberação ou cancelamento
de uma obrigação. Por isso, foi algumas vezes usada no sentido de perdoar um
débito financeiro.
Se pensarmos em termos de dinheiro,
fica mais fácil entender exatamente por que Jesus usou essa expressão. A
escritora Wanda de Assumpção, exemplifica com as seguintes palavras:
“Suponhamos que você me peça 5000 reais emprestados, prometendo pagar-me em
dois meses. Esse dinheiro é meu por direito e posso dispor dele como quiser, mas
estou contando com ele para saldar meus próprios compromissos no final dos dois
meses. Se, passado o prazo, você não me pagar, quem sairá perdendo? Você usou o
dinheiro que não era seu como quis e agora não tem como pagar. Eu fiquei sem
algo que era meu, a que tinha direito, e que agora me faz muita falta. Se eu
perdoar a sua dívida, ficarei mais pobre na mesma quantia que você me
deve.”
Em outras palavras, perdoar é doar a
perda. É aceitar o prejuízo. É privação de algo que, por direito, era meu. Tenho
que absorver a perda daquilo que faria uma diferença grandiosa em minha vida. E
se eu vier a passar fome ou outra necessidade básica por sua causa, ficará ainda
mais difícil me conformar com essa perda. Toda vez que a fome apertar ou o frio
me incomodar, vou me lembrar de que você usou como quis aquilo que agora me faz
tanta falta.
Vejamos por que é tão difícil
perdoar. Usando essa analogia, vamos pensar agora em termos de alguma mágoa ou
ofensa que alguém tenha cometido contra nós. O que acontece na área financeira
acontece também na área pessoal. Todos nós temos certas necessidades básicas que
precisam ser satisfeitas. Da mesma forma que precisamos de água e alimento para
sermos saudáveis, nossa alma precisa de amor e afeto para sermos emocionalmente
saudáveis. Todo ser humano precisa da segurança de sentir que alguém o ama
incondicionalmente, e que o valoriza por ser quem é, não por alguma coisa que
possa fazer. Assim, quando alguém me rejeita, de alguma forma maltratando,
desprezando, abandonando, gritando comigo, cobrando ou criticando, está tirando
um pouco da minha segurança e do significado da minha vida.
Quando alguém tira algo precioso de
mim, quando não sou amado, quando não me
tratam bem, é normal me sentir diminuído, com medo, confuso e sozinho. Fico então diante de duas alternativas. Na
primeira, exijo que o meu devedor devolva aquilo que me tirou. Afinal, dívida é
dívida! Por isso, fico agarrado ao pescoço do devedor até que devolva o que me
tirou, remoendo vez após vez a ofensa cometida contra mim. Na segunda
alternativa, decido perdoar, abrindo mão do que me é devido e até desejando que
a outra pessoa possa fazer bom uso daquilo que é meu. Mas, muitas vezes dizemos:
“Sim, sei que devo perdoar. E quero perdoar. Mas não
consigo.”
Nós somente podemos perdoar, porque
fomos perdoados, aceitos e reconciliados. A boa nova do evangelho é que Jesus
pagou o preço por nossos pecados com sua morte na cruz. O perdão, então,
é um ato no qual o ofendido livra o ofensor do pecado, liberta-o da culpa pelo
pecado. Este é o sentido pelo qual Deus “esquece” quando perdoa, como diz
Hebreus 8:12: “Pois serei misericordioso para com suas iniqüidades, e
de seus pecados e de suas iniqüidades não me lembrarei mais” .
Entretanto, Deus já nos deu o
suprimento que precisamos para perdoar. Deus por meio do Seu Filho Jesus
Cristo, já proveu tudo o que precisamos
para usufruir de uma vida plena de alegria e gozo, abundante
Como disse Henri Nouwen. “O
Evangelho liberta-nos da cadeia de ferimentos e necessidades, revelando-nos uma
compaixão que pode fazer mais do que apenas reagir fora das necessidades que
brotam de nossos ferimentos. Faz isso trazendo-nos a uma aceitação que antecede
a qualquer aceitação ou rejeição humana. E esse amor original a tudo abrange;
detém o poder de amar inimigos tanto quanto os amigos; o poder de permitir-nos
amar desse modo. Esse é o amor que nos faz filhos e filhas do “Altíssimo”’. Esta
é nossa verdadeira identidade. Nada pode nos tirar desta posição de aceitos e
amados de Aba.
Por pertencermos ao reino dos céus, já ganhamos crédito ilimitado para
perdoar todas as ofensas, feridas e prejuízos desta vida. Além disso, toda vez
que perdoamos uma dívida, recebemos imediatamente a mesma quantia multiplicada
na nossa conta. Esse crédito, nada mais é do que o amor de Deus que temos
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O propósito deste blog na sua forma completa é capacitar seus leitores a entenderem a Bíblia. Apresenta instrução básica eficiente do ponto de vista bíblico. Procura remover todas as falsas pressuposições racionalistas, moralistas, antropocêntricas e idólatras que já infectaram,e, na medida desta infecção, cegaram todo homem e toda cultura deste mundo a partir da queda de Adão.
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
PERDÃO, POR NÃO PERDOAR!
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