sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

QUIETUDE

Quietude
Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosa; dele vem a minha salvação.Salmo 62:1.
O homem moderno, muito mais do que em outras épocas, não é dono de sua própria vida. Vive correndo contra o relógio e arrastado pela avalanche do con- sumismo compulsivo. Os marketeiros sabem muito bem usar o arsenal tecnológico de comunicação disponibilizado pela ciência, para tentar preencher o nosso vazio existencial com coisas.
Além disso, esses sedutores brinquedinhos tecnológicos permitem que estejamos “conectados”, ou seja, desfrutando de uma falsa sensação de “estar juntos” em silêncio. É uma espécie de presença à distância, minimizando a solidão coletiva e a nossa barulheira interior. Chamam isso de Rede Social, à qual você pode pertencer enquanto lhe for conveniente, porquanto, para desfazer o vínculo basta apenas um Clic.
Mas, a nossa relação com Deus se dá numa dimensão muito mais significativa. O propósito de Deus em nos criar foi para que pudéssemos ter Comunhão Pessoal com Ele. Acontece que, logo após a nossa queda, nos tornamos inadequados para este propósito. Porém, a presença de Jesus neste mundo tem o propósito de nos fazer adequados, isto é, andar com Deus, na quietude do coração porque: nada neste mundo pode satisfazer o coração do homem a não ser Deus.
Portanto, precisamos buscar diligentemente a quietude se quisermos ter uma vida significativa enquanto peregrinos aqui na terra. Sêneca, velho filósofo e dramaturgo, há muitos séculos dizia que, quando saía com os intelectuais ou se fazia acompanhar dos dramaturgos, voltava para casa exausto e terrivelmente rouco.
Às vezes temos a mesma experiência quando estamos com as pessoas; falamos... falamos... e falamos, somos compulsivos no falar. Qual o remédio contra a tagarelice? Com certeza precisamos do toque da graça de Deus. Bonhoeffer escreve: “O silêncio real, a quietude real e segurar de fato a língua são coisas que surgem apenas como conseqüência sóbria da quietude espiritual.”
Relata-se que Domingo de Guzmán visitou Francisco de Assis e que, no transcorrer do encontro, nenhum dos dois falou uma palavra sequer. Somente depois de aprender a ficar verdadeiramente quietos é que seremos capazes de falar ao mundo.
Catherine de Haeck Doherty escreve: “Tudo em mim está silencioso ... estou imersa no silêncio de Deus.” É na quietude que experimentamos o “silêncio de Deus”, e no silêncio de Deus ouviremos a Sua voz. Quietude em que, o espírito está pronto para ouvir Deus e estabelecer comunhão com Ele.
Se quisermos ter uma vida significativa nos relacionamentos precisamos da quietude do “quarto”: Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará. Mateus 6:6.
É muito importante que tenhamos a consciência da presença do Pai - que Ele nos vê e nos ouve. E que, quando abrirmos a porta e “sairmos” do “quarto”, na alegria daquela presença - alegria esta que ninguém pode tirá-la - outros possam ser contagiados por essa alegria: Tenho-vos dito isto, para que o meu gozo permaneça em vós, e o vosso gozo seja completo. João 15:11.
É na quietude e no silêncio do coração que os significados ocultos das Escrituras se revelarão. É na quietude do coração que aprendemos a ouvir Deus, e a Sua fala é sempre nos convidando para descansar: Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Mateus 11:28.
Aquietar e permanecer em silêncio diante de Deus é ter a capacidade de “ver” e ouvir. Há,sem dúvida, muitos tipos de vozes no mundo, por esta razão, precisamos nos aquietar em Sua presença para discernirmos de onde vem aquela voz.
Mas, você pode se perguntar: por que necessito tanto ouvir Deus? A resposta pode ser simplória, mas a necessidade de se ouvir Deus, é porque precisamos conhecê-Lo como um filho que precisa conhecer seu pai. Esse conhecimento só acontece por meio de um relacionamento no qual um fala e o outro escuta. Para ouvir é necessário estar calado, quieto, em silêncio.
Muitas são as razões porque não gostamos da quietude ou do silêncio. Uma delas é que o silêncio nos faz sentir desamparados e podemos até mesmo pensar que é perda de tempo. Outra razão é que, quando falamos, nos sentimos no controle da situação. Porque, se ficarmos em silêncio, quem assumirá o controle? Muitas vezes usamos a nossa fala como meio de manipulação. Ao contrário daquele que se mantém em silêncio, o falador sugere que está confiante.
O silêncio pode ser sinônimo do que João da Cruz chamou de “noite escura da alma”. Segundo ele, a noite escura tem como propósito nos levar às delícias de amor com o Amado. Ele chama isso de graça, e acrescenta: “Oh noite que me guiaste, oh! Noite mais amável que a alvorada; oh! Noite que juntaste Amado com amada, Amada já no Amado transformada!”
Aqui vemos a nossa união com Deus em Cristo. Deus nos atraiu para Si e quer nos conduzir para a “sala do banquete”. Fomos unidos em Cristo e levados para a Sua intimidade: Leva-me tu, correremos após ti. O rei me introduziu nas suas recâmaras. Em ti nos regozijaremos e nos alegraremos; do teu amor nos lembraremos, mais do que do vinho; os retos te amam. Cantares 1:4
O que vem após a experiência de morte? Vem o convite. O Senhor Jesus como Rei nos convida para a Sua intimidade - “O rei me introduziu nas suas recâmaras”. É aqui que em silêncio desfrutaremos de Sua presença. É neste lugar que em silêncio contemplaremos o Rei da glória.
Estamos falando daquilo que Tomás Kempis chama de uma “amizade familiar com Jesus”. Nosso amigo que é visto pelos olhos da fé. O Amigo de fato de nossas almas. Que privilégio sermos chamados Seus amigos! Já vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; mas tenho-vos chamado amigos, porque tudo quanto ouvi de meu Pai vos tenho feito conhecer. João 15:15
A amizade com Deus é a amizade de um filho com o pai. Assim como um filho passa a ter diariamente um relacionamento mais íntimo com o pai, podemos estreitar nosso amor por Deus, ampliando Seus interesses, tendo Seus pensamentos e compartilhando de Suas iniciativas. Uma grande amizade requer crescimento, amigos devem andar juntos.
Tenho-vos chamado amigos. Quão profundamente essas palavras expõem o segredo da vida de Cristo na terra, e de Sua vida, agora, em nós. Estar a sós com Ele é uma das maiores bênçãos da vida, pois Ele vive em nós pelo Espírito Santo e nos revela e partilha conosco o significado da Palavra “sozinho com Ele”.
Sozinho com Ele na quietude, ouvindo a Sua voz. Que maravilhoso e inacreditável privilégio poder ouvir a Sua voz, e também nos expor por completo a Ele! Ouço a voz do meu Amado; ei-lo galgando os montes, pulando sobre os outeiros. Cantares 2:8. Voz que vem acompanhada de boas novas.
Temos a maior das bem-aventuranças quando na quietude ouvimos a voz de Deus. Não somente uma voz, mas uma voz reveladora. É a voz da “ressurreição” quando tudo era “morte”. É a voz do “não temas” quando não havia nenhuma saída, quando tudo era pavor, dizendo: “nunca te deixarei e nunca te desampararei”.
Na psicanálise foi Freud quem revelou o imenso poder do silêncio. Há um momento em que a pessoa sente o terrível peso do silencio. Anseia que o médico lhe diga alguma coisa. Para Paul Tournier ( 1898-1986), médico e conselheiro cristão, questionado sobre como ajudar a outros em suas dificuldades, ele disse:“Não tenho condições de saber qual a vontade de Deus para outra pessoa. Mesmo na psicanálise, os médicos preferem que seus pacientes façam suas descobertas. Se ele começa a dar sugestões, quase sempre os pacientes acabam errando o caminho.”
Escreve Thomas à Kempis, “A pessoa que deseja viver uma vida significativa precisa deixar a “multidão” e passar mais tempo com Jesus. Porque em tempo de quietude tiramos o “mundo” dos ombros e suspendemos a necessidade de dominar e controlar todos e tudo.” Alguém disse para Richard Foster, com grande alivio: “De agora em diante, demito-me de ser o executivo do universo.”
Quando lemos os Evangelhos, com freqüência vemos Jesus se retirando da multidão para um lugar ermo para ficar a sós com Seu Pai. E, despedidas as multidões, subiu ao monte, a fim de orar sozinho. Em caindo a tarde, lá estava Ele, só. Mateus 14:23. Antes mesmo de escolher os 12 discípulos, o nosso Senhor orou: Naqueles dias retirou-se para o monte a fim de orar, e passou a noite orando a Deus. Lucas 6:12.
Estar a sós com Deus na quietude do coração não é uma opção, é uma necessidade do cristão. Se tivermos a consciência de que nada podemos e que, em nós, não há força, descobriremos que o caminho da quietude é o lugar mais adequado.
Certa vez o irmão Lawrence foi interrogado por um dos homens que fazia parte de sua comunidade, sobre seus métodos para chegar à intimidade com Deus. Ele respondeu: “Desde a minha chegada ao mosteiro considerei Deus como o objetivo de todos os meus pensamentos e desejos... Procurei sempre ter uma consciência da presença de Deus... (...)... Quando começava meu trabalho, sempre dizia a Deus, com a confiança de um filho: “Oh, meu Deus, desde que está comigo e que devo agora, em obediência a Tua palavra, dedicar a Ti o que estou fazendo... (...)... Peço-Te que me concedas a graça para continuar em Tua presença. Para isso, faze-me próspero por meio de Tua assistência.”
Estar a sós com Jesus é também desejar ser parecido com Ele. Fiel é Deus, pelo qual fostes chamados à comunhão de Seu Filho Jesus Cristo nosso Senhor. I Coríntios 1:9.
Ser chamado para andar com Jesus não é um privilégio de alguns, esse chamado é para todos os filhos de Deus. O homem foi criado simplesmente para viver para Deus e, nessa caminhada, permitir que Cristo seja revelado em todo o seu viver.
Deus Pai anela comunicar ao homem a grandeza do Seu amor, comunicar-lhe Sua bondade e Sua graça. Não podemos pensar na salvação como um escape do inferno e nem tão pouco pela beleza do céu. Precisamos da revelação da parte de Deus de que, o nosso chamado vai além de nos livrar do inferno e nos levar para o céu. O supremo chamado de Deus é para que o conheçamos na revelação de Seu Filho.
O projeto de Deus em nós restaurar ao estado que nos encontrávamos é para andarmos com Ele. Que Deus pela Sua infinita graça nos cative para isto. Amém.
 
Soli Deo Glória.

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